ÀS CEGAS
Às claras
procuro a gema da palavra,
rompo a casca e salto para o palco,
rio, gargalho, interpreto,
perdido, casto,
digo o texto e espero pelos aplausos,
pelo silêncio demoníaco, infausto...
Viver nesta peça
procurando o papel que me faça suar a testa,
que me faça vestir os andrajos e o manto,
no cortejo de cegos e aleijados,
num iate em em Mônaco,
na procissão subindo o monte para a crucificação,
coçando os pés, sentado na porta da cabana do meu coração...
Ser ator da minha própria peça,
repetir o gesto até que ele, às cegas,
encontre o ponto certo de representação,
trazer à tona as vivências dos escuros becos,
a luminosidade dos intrincados e sutis textos,
a faca do fim do mistério penetrando no coração...