EU E MEU AMIGO CEGO
EU E MEU AMIGO CEGO
Carlos JotaPê Figueiredo
Sentei com um amigo cego
e perguntei: “-És feliz?”
Ele respondeu:”-Não nego
que as vezes choro”... então quis
que eu ouvisse um pouco mais
sobre as tristezas que traz.
Falou então: “- Fico triste
quando ’sinto’ a falsidade
que nas pessoas existe
escondida, se a verdade
muitas vezes declarada,
é mentira descarada”.
Pediu-me que eu desculpasse
sua modéstia pequena
e que eu considerasse
com paciência serena,
que as coisas que um cego ‘sente’
não se encontra em toda gente.
‘Sente’ se um ‘benfeitor’ é
um avarento enrustido;
‘Sente’ se um crente tem fé
ou não passa de um fingido;
‘Sente’ se um ‘sim’ é um ‘não’
guardado no coração.
Me disse então: “Eu não nego
algo que não é tolice:
é a condição de ser cego
e não ver tanta sandice...
Restrito em minha cegueira,
não cometo tanta asneira”.
Despedi-me do amiguinho
com o meu fraterno abraço...
e fui saindo de mansinho
como quase sempre faço.
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