Pouco importa venha a velhice.
O que é a velhice?
Seus ombros suportam o mundo
E ele não pesa mais do que a mão de uma criança.”

                                                        Carlos Drummond de Andrade



Sei que vou morrer um dia, e esta sabedoria
É uma verdade que eu nem penso contestar.
Entretanto, saber disso não ajuda nem alivia,
Aliás, isso é coisa que eu gostaria de ignorar.

Se eu pudesse viver sem pensar nas estações
Não guardaria nos arquivos da minha mente,
Esta lembrança de aniversários e de gerações
Que se sucedem como elos de uma corrente.

Pois esse é o mal que a idade nos apresenta:
Cada dia que na folhinha tem que ser riscado
É como a renda que o tempo nos acrescenta,
E sobre a qual incide esse tributo tão pesado.

Que bom seria poder pensar como o meu cão;
E não ficar olhando escoar as areias do tempo,
Nem sentir que a vida se parece com o balão,
Cujo destino é guiado eternamente pelo vento.

Mas quem sabe o que nos leva as esperanças,
Seja apenas a soma dessas memórias fugidias;
Um fardo inútil de experiências e lembranças,
Que não se aprende a descartar no fim do dia.

E assim levamos para cada dia que amanhece,
A memória do ontem, tal como uma carapaça,
Que se nos adere na medida em que se cresce,
E mais dura fica quanto mais o tempo passa.

Mas se o pensamento não pudesse ir adiante,
Quem sabe a vida jamais tivesse esse declive,
E viveríamos sorvendo o mel de cada instante,
Eternizando-se nos momentos em que se vive.