EM QUEDA LIVRE
Caiu a chuva!
Inundou a rua
Se salvou só grua.
Veio em queda livre
Qual tudo que vive
Sem pedir perdão.
É chuva bem velha
Água que destelha
A sedimentação
Da calçada armada,
Barraca deságua
Pela solidão.
Caiu a chuva!
Toda vida crua
Dentre as dores nuas.
Caiu tempestade
Pela frialdade
Dessa convulsão,
Caiu na desgraça
Toda abandonada
Da drogadição.
Caiu a árvore!
Toda a cidade
Então se quedou,
A calamidade
Caiu com vontade
A tudo soterrou...
Caiu de saudade
Na enxurrada solta
Corrente a levou...
Infiltrou a chuva
Sua raiz já fofa,
Que ninguém cuidou.
Caiu a água!
Com força mandada
Peito acelerou...
Toda a copa armada
-De flores em florada-
"Em copas"... se fechou.
Caiu a chuva!
Os cupins em fuga
(de barriga imunda!)
Deixaram pra trás
A diversidade
Carcomida carne
Tudo se desfaz.
Caiu a chuva!
Multidão na rua
Sem poder correr
Despencou a máscara
Toda a desgraça
A se perceber.
Caiu a chuva !
E a maquiagem
Escorreu ao chão
Não há mais semáforo
A orientar os passos
Já sem direção.
Caiu a chuva!
E foi chuva ácida
A nos carcomer...
Foi-se o sorriso
Pelo "pleito aflito"
Mais nada a perder.
Caiu a chuva!
Esperança bruta
Se quedou também,
Apagaram as luzes
Na enxurrada –abutres!
Das vidas em desdém!
E a cidade escura
Segue pelas ruas
Das “não –soluções”.
Ouve-se um gemido
Do terror caído
Em vãs orações.
Caiu a chuva...
Raios que nos parta!
Quanta infestação...
Povo abandonado
Destino roubado
Só sofreguidão.
Nuvem de fumaça
Poluição armada
Céu enegreceu...
Veio outra chuva
De navalha aguda
Dor desfaleceu.
Foi chuva de pedra
Que o futuro infesta
De contradição,
Surrealidade!
Piche na cidade
Espelha a inundação.
Trânsito parado
Peito já suado
Estanca a pulsação,
Lá vem outra chuva
Que Deus nos acuda
Dessa maldição.
Caiu mesma chuva,
Que a vida inunda
de interrogação...
"Foi culpa da chuva".
Nada assegura
Essa constatação.