BICHO DE FINO TRATO
Enquanto o ser humano não morre
Atolado e com um bicho de pé
Ele segue dos bichos pensando
Ser o maior e bem mais do que ele é
Querendo dar o pulo do gato
Num abraço de tamanduá
Ao tempo em que a vaca vai pro brejo
Se desgarrando do seu carrapato
O bom cabrito não berra
Mas ninguém tem sangue de barata
Segue o homem no visgo da lesma
Com olho de peixe morto na terra
Descansa numa dose pra leão
Como raposa tomando conta do galinheiro
Adquire logo um bico de papagaio
Com suas minhocas na cabeça de papelão
E dá logo um drible da vaca
Com sua delicadeza de jumento
Bancando um rato de praia
Avestruz, enfia a cabeça na maca
Enquanto o ser humano não morre
Atolado e com um bicho de pé
Ele segue dos bichos pensando
Ser o maior e mais do que ele é
Seria macaco tomando conta de banana
Não fosse um tico tico no fubá
Mas, não tem mosquito, sob a luz é mariposa
Vida de cachorro não é para bacana
Mais valente do que onça pintada
Ele se arvora mexendo em casa de marimbondo
Discorda do tempo a passo de cágado
Porque da vida o que ele entende é quase nada
As lágrimas de crocodilo lhe movem
Em direção aos dentes de uma piranha
Deixando-o feito uma barata tonta
É um leão ou leoa enquanto jovem
Embora seja, ninguém se diz ovelha negra
Pois em boca fechada não entra mosca
Puxando brasa para sua sardinha
Galinha morta então se finge, é a regra
Enquanto o ser humano não morre
Atolado e com um bicho de pé
Ele segue dos bichos pensando
Ser o maior e mais do que ele é
E numa valentia de vaca parida
Puxa destemido o seu carro de boi
Sem beber água e feito camelo
Sai baratinado cuidando da vida
O cabra da peste então se ilude
E de bode amarrado cai na luta
Vira pombo sujo engolindo sapo
Feito uma anta faz o seu ataúde
Mas, mordido pela mosca azul
Logo um filho da égua já é
E aí, mais gordo que nem uma paca
Vira ladrão de norte a sul
Faz o seu cavalo de batalha
Passa a ser honesto tipo beija flor
Trabalhando é burro de carga
Pois a justiça tarda mas não falha
Enquanto o ser humano não morre
Atolado e com um bicho de pé
Ele segue dos bichos pensando
Ser maior e melhor do que ele é
Logo uma gata mansa o ampara
Senão ele vira uma jararaca
Mosca na sopa de alguém ele é
Polido, se livra do cupim na cara
E se arma de um pé de coelho
Pois a sorte é feito mula sem cabeça
Canta mais que um rouxinol
Buscando assim não ouvir conselho
Filho de peixe, peixinho é
Nem sempre isso se sucede na vida
Antes que vire um bicho de sete cabeças
Eu me recolho, vou dar no pé
Com a pulga atrás da orelha
Vou dormir meu sono de passarinho
Sem tomar o leite de camelo
Ouvindo cobras e lagartos da velha
Enquanto o ser humano não morre
Atolado e com um bicho de pé
Ele segue dos bichos pensando
Ser o maior e melhor do que ele é.
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Salvador-BA, 09-07-16.