O CULTIVO ETERNO
Planta-se morte como quem admira canários:
antes o canto, depois as gaiolas.
Cultiva-se a morte como quem cultiva um amor,
pérola ordinária
a dourar a consciência do homem.
Identifica-se a morte como quem classifica um
legume.
A semente pode ser ponto de bingo,
conta de colar,
confete.
Prepara-se a morte como quem apronta terra e
mar
até que o morto desabroche
e morrendo em flor preceda,
um cortejo de pássaros,
o séquito das ostras,
e a opulenta procissão
adornada por verduras frescas.
Aguarda-se a colheita da morte
e se arma a estufa celeste
ambiente sob controle,
embora o morto indiferente,
não obstante dentro do ataúde,
bem encontra a sua forma final,
de fungo enclausurado.
DO LIVRO: "BORBOLETAS NOTURNAS NÃO EXISTEM"