Enciclopédia à Saturno [Solilóquio Esculpido].

I

A (1)

Ti (2)

Lua; (3)

Fera (4)

Cheia, (5)

Alumia (6)

A gelada (7)

Promessa (8)

Encantada, (9)

De todo o dia. (10)

II

Ao tênue gozo, (11)

Torno-me velho. (12)

Finda a memória (13)

Exagerada e tais (14)

Dissoluções à toa. (15)

Não preciso fingir (16)

Saber de tudo o tempo (17)

Todo, ninguém abriga o (18)

Passado como fugaz fim (19)

De toda lembrança feliz. (20)

III

Forma antiga de me perder; (21)

A história toda remembrar, (22)

Esfumaçada, fosca; distante. (23)

Permanece como desejo deles, (24)

Fingir estar preso à grilhões.(25)

Reconheço-o, nunca menti à veras, (26)

Me enamorei de fracassos fatais, (27)

Imensos e constantes de friezas. E (28)

Se permite, explico, sou romântico, (29)

Morrer de amar soaria-me tão natural. (30)

IV

Criamos gigantes para desmoronarem! (31)

Quem quer ser si mesmo por inteiro ri-se, (32)

O tempo todo imagino ser algo que não sou. (33)

E por mais infame que pareça, morrer-me (34)

É dos mais sinceros prazeres que vivo são; o (35)

Breve segundo, a derrocada de meus atores, (36)

Toda aquela firula épica em que sofro, não sou. (37)

O passado acaba servindo de grande palco e a ti, (38)

Não há outro calvário, que colorir paisagens e (39)

À cores quentes tingir toda a penumbra revivida. (40)

V

Esforços devem ser consistentes se queres ver-te, (41)

Não adianta caricaturar sentidos, e desperdiçar (42)

Memória ao reforçar incerteza natural à congênita (43)

Natureza humana. Vaga, incompleta, à sensível alma nua. (44)

Não podem acusar o tempo de desfigurar o poeta sóbrio, (45)

Como àquelas falésias imortais dos cinemas do mundo, ou (46)

Corajosas promessas que fazemos na juventude, que ferem (47)

Sem mazelo qualquer outra estrutura que possas vir criar. (48)

Ambos sabemos, é escolha encarar martirizado o rigor, a ter (49)

De assumir-te perante a vida, fincado em teus próprios pés nus. (50)

VI

O poeta não escolhe; vive ou viverá mais. E que sagre-se ofício! (49)

Não há que temer ver transformado em antinomia descarada (48)

E queixar-te pro mundo que falta-te verdade fictícia real. (47)

Mudar-te é a única forma de ser a ti mesmo realmente, anota: (46)

Que graça há em vestir as roupas todas iguais, tua parte (45)

Não cabe ao uso, mas ao descuido de pensar no que trajar. (44)

Exercício apenas disfarça a realidade permanente, (43)

À tangente de tudo resiste alguma coisa comum, que (42)

A todo custo tentamos resgatar à luz presente, sem (41)

Que demos conta de seu significado primo - educar. (40)

VII

Compreendo, agora, por que tudo há de vir a acabar. (39)

Por que nada pode ser eterno, ainda que em sonho, (38)

Nada disso, precise deixar de existir, exceto (37)

Pelo simples assédio de fantasias imorais. (36)

Apreço à fuga da impermanência das coisas; (35)

Corriqueiro ultraje, refiro-me a solidez (34)

Daquilo que se constrói no imemoriável. (33)

A experiência essencialmente crua de (32)

Onde esfera nossa riqueza artificial. (31)

Ao homem cabe o caminho despojado! (30)

VIII

Mas volto a sonhar com o passado que (29)

Sequer sucedeu-se em mim ou noutro (28)

Qualquer. Não passas de delírios! (27)

Novamente a sobriedade paga-me (26)

Com a marca do realismo, e seca-o; (25)

Minhas tintas de imaginária (24)

Lucidez surrada, e roubada de (23)

Livros dos quais nem li as figuras. (22)

Sou o autor, e faço moca, enfim, (21)

Um brinde à brumas banais. (20)

IX

A lua já começa a sorrir, (19)

Parece que vai embora. (18)

Não se despede, e com a (17)

Pressa doutro luar (16)

Por resplandecer. (15)

Ignora-me a cruel, (14)

E consome-me na (13)

Pouca fagulha (12)

Dos sonhos de (11)

Concretude. (10)

X

De olhos Já (9)

Cerrados, (8)

Lembrar (7)

É viver (6)

Outro. (5)

Pena, (4)

Véu, (3)

Eu. (2)

(1)

Hernâni Arriscado - Enciclopédia à Saturno [Solilóquio Esculpido]

Hernán I de Ariscadian
Enviado por Hernán I de Ariscadian em 21/06/2016
Reeditado em 21/06/2016
Código do texto: T5673652
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