AS TRÊS IRMÃS DO POETA ( Castro Alves)

É Noite! as sombras correm nebulosas.

Vão três pálidas virgens silenciosas

Através da procela irrequieta.

Vão três pálidas virgens... vão sombrias

Rindo colar num beijo as bocas frias...

Na fronte cismadora do Poeta:

"Saúde, irmão! Eu sou a Indiferença.

Sou eu quem te sepulta a ideia imensa,

Quem no teu nome a escuridão projeta...

Fui eu que te vesti do meu sudário...

Que vais fazer tão triste e solitário?..."

- "Eu lutarei!" - responde-lhe o Poeta.

"Saúde, meu irmão! Eu sou a Fome.

Sou eu quem o teu negro pão consome...

O teu mísero pão, mísero atleta!

Hoje, amanhã, depois... depois (qu'importa?)

Virei sempre sentar-me à tua porta..."

-"Eu sofrerei"-responde-lhe o Poeta.

"Saúde, meu irmão! Eu sou a Morte.

Suspende em meio o hino augusto e forte.

Marquei-te a fronte, mísero profeta!

Volve ao nada! Não sentes neste enleio

Teu cântico gelar-se no meu seio?!"

-"Eu cantarei no céu" - diz-lhe o Poeta!

Castro Alves ALVES, C., Espumas Flutuantes, 1870.

Castro Alves
Enviado por Miguel Toledo em 05/05/2016
Reeditado em 16/05/2016
Código do texto: T5625679
Classificação de conteúdo: seguro