Mobília
Perdi em um canto da gaveta
minha obra infinita.
Abafada sob montes de papéis letras mortas.
Papéis que se vergam sob o peso
inexorável das dobras.
…
Um redemoinho se estende no corredor.
Voam moscas brancas tingidas de preto,
asas cegas infinitesimais.
Me banho com esse súbito despertar do
que outrora foram expressões salpicadas
de sentido.
…
Na cadeira dura é onde meu ânus se assenta.
Estar sobre o plano é condição prévia
para que o pensamento tome seu impulso rumo
a horizonte algum.
…
Ao ver sua cara vincada
e digna subindo o ônibus
como quem desnovela uma
passarela.
O rasgo do sorriso captura minha atenção.
Não há porque esperar nada que venha dali.
Indassim, me inquieto e me ponho a desenhar
sentenças entre uma parada e outra.
...
De cima, parece uma formiga de óculos.
Agitando, em movimentos frenéticos, as
patas dianteiras.
O observador trouxa não sabe da astúcia
do inseto.
Traceja planos de fuga labirínticos, que
passam ao largo dos olhos dos especialistas.
Odracir Aruom
180912
10h17