Post-it sobre a vida

Não te avisaram

Que a vida não seria fácil?

Que pena que não se lembre

Dos enjoos, dos vômitos,

Dos pés inchados,

Da dor lombar,

E da eclâmpsia

Antes mesmo do teu amanhecer.

Certamente não se lembre

Da primeira febre,

Da diarreia – da desidratação,

Do broncoespasmo – da dispneia.

Que bom que não se lembre

Dos primeiros tombos

E das primeiras raladuras...

Quanta dor!

Que bom que não se lembre!

Provavelmente não se lembre

Do primeiro não,

Das primeiras proibições.

Do choro de birra

E dos primeiros castigos.

Não te avisaram

Que a vida não seria fácil.

Não te avisaram que o tempo não seria teu?

Ensinaram-te que cada coisa tem seu tempo.

Não te avisaram que não poderias ter o tempo.

Ele cavalga na cadência da transformação,

Nele a existência flui implacavelmente.

Não te avisaram que iria sofrer por amor?

E com ele iria viver os melhores momentos?

Ah! E a tal felicidade?

Não te avisaram que é um oásis?

E que na vida iria encontrá-la

Somente em alguns momentos?

E que logo após iria retomar

A caminhada pelo deserto

Sem a certeza de novamente encontrá-la?

E os filhos?

Não te avisaram que iria sofrer

Com as incertezas?

Que apesar de tê-los iria perdê-los?

Não fique triste! A vida é mesmo assim.

Incertezas a cada instante,

Morte a cada dia.

Nisso, porém, não há tristeza.

Somente a mais pura alegria.

Não te avisaram que o belo depende do feio?

Como a vida da morte?

E que viver é morrer a cada instante?

E que a vida só é bela

Porque existem contradições?

Que bom que não te avisaram

Que a vida não seria fácil.