Bússola
Como se eu morresse em dois dias,
me sinto ávido de fazer o que ainda não fiz;
de perceber integralmente a realidade,
de sugar do mundo em estado de fruta
toda a essência do Belo.
Perplexo.
Diante de mim,
a gente é empurrada pela rotina
pelas calçadas, entre cubos de concreto e vidro.
Todas têm um destino próprio dentro de si,
sabem exatamente onde têm de ir.
Não eu.
De braços como pêndulos,
uma profusão de vontades
pesa-me sobre os ombros;
muito em mim ainda está pendente,
e não sei por onde começar.
Elas passam —
fluxo do cotidiano.
Olho para isso tudo. Há ali,
entretanto,
entre todos,
agachado como um empecilho
da exceção, que obstrui
a fluidez do dia a dia,
um homem e seu cachimbo.
Devo reparar nele?
Como a fumaça,
estou pleno do acaso.
As pessoas entram
e saem,
andam e
correm,
têm pressa de chegar.
Mas eu não conheço meu destino,
meu ponto de chegada.
Mas há mesmo uma chegada?
É mister haver um destino?
Não tenho uma bússola
e estou perdido.
Perdido sem nem mesmo ter um lugar de que se perder.