O MALTRAPILHO
O sol não vai tardar seu regresso.
Enquanto eu cumpria minha rotineira sobrevivência no trabalho,
Ele foi cumprir sua extensa jornada a cerca do mundo.
(Com muito mais paradas para cafés e almoços que eu, diga-se de passagem)
São assim minhas noites,
Acomodado e refém
De uma escravidão mascaradamente remunerada.
No retorno pra casa, observo o silêncio de uma cidade fantasma
E me confundo com a calçada, pois
Bem acomodado no fundo do ônibus, sinto-me tão inerte quanto.
E, enquanto, do vazio,
Fantasio e anseio a maciez do meu leito,
Detenho-me com um quadro
Rapidamente emoldurado pela janela por onde entrevejo.
Uma figura estranha, um maltrapilho, talvez andarilho,
Que, devido ao estrépito do motor
Despertou-se do seu inaudito mundo dos sonhos.
E, por uma fração de segundos,
Fitou-me com seus olhos enferrujados pelo tempo
Por tempo suficiente para que eu externasse toda a minha superficialidade
E ele toda a sua profundeza.
Ele,
Um homem pobre.
Eu,
Um pobre homem.