Um estranho no tempo
Num tempo, que não tinham matado a música,
Pulsavam nela certos valores, ainda que básica;
Não acusava como hoje, as sequelas da tísica,
as nulidades ainda eram, apenas, coisas nulas;
corruptos tinham vero receio dos microfones,
Então, não embalavam bostas em celofanes,
Não se ordenavam os crimes pelos telefones,
cargas eram bem mais leves, posto que, mulas...
Gado marcado sim, mas, os donos tinham pejo,
Os ladrões com modéstia até escondiam o sujo;
Pois a desonra era mácula que diminuía o gajo,
No filme da vida era possível torcer pro mocinho;
Naquele tempo, mentira inegável corava a face,
Obscenidades não eram servidas como um doce;
Entretanto, a teia que a aranha moderna tece,
mata minha inocência, cada dia, um pouquinho...
Os valores pesavam muito mais que interesse,
E perdia o respeito qualquer que os afrontasse;
A censura aparecia se acaso, vergonha sumisse,
Direitos não eram pretextos para o mau caráter;
Os pais ainda sabiam bem mais que seus filhos,
Eram eles os comboios que guiavam nos trilhos,
Heróis para serem imitados, mesmo que falhos;
Os seus valores traziam o DNA da célula máter...
Hoje, os metecos arrostam direitos dos cidadãos,
Os fedelhos ousam desrespeitar até aos anciãos;
Infelizmente está no lugar do teto o fétido porão,
E a televisão espalha glamourização da vergonha;
Se acesso a internet vejo logo a bunda da Anitta;
As tetas siliconadas da Urach sentindo-se bonita,
Até em cânticos a vetusta pornografia crepita,
Não mudam de travesseiro, nem lavam à fronha...
Sei bem que essa nostalgia soaria muito démodé,
Se tais as lessem ririam de mim, seria um bafafá;
As redes sociais espalhariam qual chama o tititi,
Todos depreciariam ao velho vinho e seu odre;
escrevo como pra mim, como se ninguém lesse,
ou, lendo passasse por alto e de todo ignorasse,
sonhei que um dia humanidade amadurecesse,
porém, nunca suspeitei, vê-la assim, tão podre...