"OS HOMENS DA TERRA" - DE VINICIUS DE MORAES - 1962

OS HOMENS DA TERRA

Em homenagem aos trabalhadores da terra do Brasil, que enfim despertaram e cuja luta ora inicia.

Senhores Barões da terra

Preparai vossa mortalha

Porque desfrutais da terra

E a terra é de quem trabalha

Bem como os frutos que encerra

Senhores Barões da terra

Preparai vossa mortalha.

Chegado é o tempo de guerra

Não há santo que vos valha:

Não a foice contra a espada

Não o fogo contra a pedra

Não o fuzil contra a enxada:

- União contra granada!

- Reforma contra metralha!

Senhores donos da Terra

Juntais vossa rica tralha

Vosso cristal, vossa prata

Luzindo em vossa toalha.

Juntais vossos ricos trapos

Senhores Donos de terra

Que os nossos pobres farrapos

Nossa juta e nossa palha

Vêm vindo pelo caminho

Para manchar vosso linho

Com o barro da nossa guerra:

E a nossa guerra não falha!

Nossa guerra forja e funde

O operário e o camponês;

Foi ele quem fez o forno

Onde assa o pão que comeis

Com seu martelo e seu torno

Sua lima e sua torquês,

Foi ele quem fez o forno

Onde assa o pão que comeis.

Nosso pão de cada dia

Feito em vossa padaria

Com o trigo que não colheis;

Nosso pão que forja e funde

O camponês e o operário

No forno onde coze o trigo

Para o pão que nos vendeis

Nas vendas do latifúndio

Senhor latifundiário!

Senhor Grileiro de terra

É chegada a vossa vez

A voz que ouvis e que berra

É o brado do camponês

Clamando do seu calvário

Contra a vossa mesquinhez.

O café vos deu o ouro

Com que encheis vosso tesouro

A cana vos deu a prata

Que reluz em vosso armário

O cacau vos deu o cobre

Que atirais no chão do pobre

O algodão vos deu o chumbo

Com que matais o operário:

É chegada a vossa vez

Senhor latifundiário!

Em toda parte, nos campos

Junta-se a nossa outra voz

Escutai, Senhor dos campos

Nós já não somos mais sós.

Queremos bonança e paz

Para cuidar da lavoura

Ceifar o capim que dá

Colher o milho que doura,

Queremos que a terra possa

Ser tão nossa quanto vossa

Porque a terra não tem dono

Senhores Donos da Terra.

Queremos plantar no outono

Para ter na primavera

Amor em vez de abandono

Fartura em vez de miséria.

Queremos paz, não a guerra

Senhores Donos de Terra ...

Mas se ouvidos não prestais

Às grandes vozes gerais

Que ecoam de serra em serra

Então vos daremos guerra

Não há santo que vos valha:

Não a foice contra a espada

Não o fogo contra a pedra

Não o fuzil contra a enxada:

- Granada contra granada!

- Metralha contra metralha!

E a nossa guerra é sagrada

A nossa guerra não falha!

Vinicius de Moraes. Poemas para a Liberdade. Violão de rua. Civilização Brasileira: Rio de Janeiro, 1962.

VINICIUS DE MORAES
Enviado por Ismar Guijarro em 06/10/2014
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