SETENTA VEZES SETE
Contra mim
Apresentas o teu juízo.
Contra mim
Estendes a tua mão
E apontas, com teu dedo,
Um a um todos os meus tropeços.
Contra mim,
Trazes a balança da justiça
E pesas todos os erros cometidos;
Todo o mal que pratiquei
E todo bem que deixei de fazer.
Contra mim,
Só contra mim te fazes Juiz,
E decretas minha condenação,
Fazendo-me chorar de dia,
Que me farás pela noite, então,
Quando me assustam as trevas e a solidão?
Outros pecam e riem!
Eu tropeço e pranteio madrugada adentro,
Engolindo minhas lágrimas amargas,
Como espadas afiadas
Partindo o âmago de minha alma.
Outros pecam e riem!
Tripudiam sobre meu corpo
Como quem pisa um tapete vulgar
Estendido por vós diante deles.
Contra mim,
Só contra mim envias teus anjos vingadores
Sol ardente,
Brisa gélida,
Tormentas, trovoadas e vendavais,
Só contra mim, a ninguém mais.
Teus primogênitos gigantes,
Encharcados de sangue alheio
Contam hinos de vitória.
Mas contra o teu menino,
Desferes os golpes do destino,
Contra mim,
Contra mim, somente,
Arrancas a raiz, o fruto e a semente!
Se és tão justo,
Por que, para o meu desgosto,
Quase num susto,
Não antecipas o meu juízo final?
E
Qual
Então, é o meu mal?
Não sou anjo, nunca fui santo,
Sou homem, afinal!
Se me querias perfeito,
Por que me fizestes de nervos e carne?
Ai de mim,
Pobre poeta pecador!