MOMENTOS (Florescência) Minha música

MINHA MÚSICA

Fila Sabino

Minha música não é líquida

Mas mata sede

Minha música não é sólida

Mas alimenta

Volátil, profana e etérea

Andeja absorta o espaço

Lótus voltando ao Lácio

Pueril, lactente e puérpera

Minha música não mata

Contamina

Minha música não cura

Vacina

Fonte emanando vida

Irradia luz pelos dias

Encanto, quebranto, virose

Arco íris embalando vozes

Contraídas no primor da língua

Parida para girar a esfera

Ária solta na atmosfera

Vozeia em velocidade

Acordes colhidos da goela

Às vezes avança ou remansa

Em lágrimas nos olhos de alguém

Que se imerge em saudades

Do amor (re)tido ou relapso

Ou mesmo repousa em seus lábios

Decanta

E você canta, feliz

Recita. Excita

Encanta!

Minha música é volátil

Imanente

Exala

Fumega

(E)vapora

Mas peregrina

Voeja

Embala

Navega

Ancora

Perfulgente ondeia sentimentos

Inundando aldeias e cortiços

Visitante de véspera e indulgente

Invoca o perdão dos feitiços

Retendo o amor do momento

No colo da exuberância

Prelúdica

Emana

Crepúscula

Entona

Raiante

Levita

Esquiando em neve lagos corações

Fragmenta o gelo dos ressentimentos

Osculando lábios descontentes

Ao velar amores no altar dos amantes

Tolhidos de reminiscências

Grávidos de tolerância

Minha música é tímida

(In)contida

Mas (in)comoda

Implica

Minha música é frívola

Noctívola

Mas cum grano salis

Vigilante

(E)lucida

Minha música é d’alma

Cúmplice

Símplice

Íntima

Âmaga

Porém zelosa

(R)enuncia

Sê sestra

Sê canha

...mas meio

Por pertinaz

(Pre)vidente

(Des)credita

Sê modesta

Sê façanha

...mas semeio

E, por evidente

(Des)toante

(In)tolerante

(Pre)nuncia

Sê bonita

Sê bacante

...mas amante

Crepúsculo de amor latente

Preluzindo a felicidade

De sonhos enraizados

Nos peitos desiludidos

Preludia a canção ardente

Perpetuando a liberdade

Pelas cárcovas do passado

Nas asas dos descontentes

Minha música é crida

Avis

(In)crível

(Per)jura

(Ir)real

(Des)leal

(In)crédula

Rara

... mas nata

(Des)entranha

Arrebanha

Alimenta

Incrementa

(Re)inventa

Assanha

(In)exata

(In)sensata

Acorrenta

Arrebenta

Arrebata

O coração contraído contenta

Ao ser envolvido do nada

Colhendo o veludo da rosa

Cegados os olhos da sombra

Adeus sentimento tolhido!

Adeus angústia contida!

Da negra ovelha em penumbra

Agrilhoada e insólita

Não se ouvirá mais o balido

Minha música é cósmica

Finítima

Sidérea

Mas telúrica

Silábica

(Re)verbera

Plangendo a acidez do amargo

De quem escureceu na alma

O brilho ancho da paixão

Luzindo a solidez do afago

De quem amanheceu no âmago

A plenitude da razão

Minha música é translúcida

Volitante

Seduz

Permite

Mas enfeitiçante

Transcende

Perlustra

Acusma

Perjurando sortilégios

Invocando benefícios

Engravidando bondades

Exilando exílios

Erguendo descridos

Aliviando saudades

Saudando encontros

Parindo auxílios

Parabenizando aplausos

Prolongando ecos do bem.

Minha música é plácida

Messiânica

Redime

Sereneia

Resultante

Pacifica

Reverencia

Mas intriga

Revoga

Castiga

Refulgente, surpreende a frigidez da pressa

Desfigurando seus motivos e azougue

Ao repensar a pulsante noite

Do despucelar e da promessa

De, consumado, jamais se desenlaçar.

Minha música é sem ordem

Volupta

Premente de arroubo

Corteja

Ávida de sonhos

(A)ventura

Constelar e ubíqua

Anseia

De ausência previdente

Campeia

Procura

Mas quem não suplica invadido de ternura?!

Minha música é doutrina

Encima

Ilumina

(Es)cultura

Pincela

Revela

Mas operária

(Ó)pera

(Des)cara

(Des)cura

(Ex)orbitante

Ascende

(Sem) front

(Com) norte

Fronteira

Transcendendo divisões

(Per)passa limites e distâncias

Desmistificando medos

(En)laçando mãos entre mãos

Cultuando uniões

Mesmo que umas das outras

Não aliancem os dedos

Mesmo que umas das outras

(Des)conheçam a pulsação

Raiz, carência, razão.

(Noções (des)armam nações

Nações (des)amam noções)!

Minha música é meu cultivo

Luminal

Leve

Livre

Lav(r)a

Alvissareira

Dimana de amor febril

Que nutro por minha terra

Meu chão

(I)nata, em mim eterna

Minha música é brasileira

Todavia, quando divina

Minha música é 'cochanina'.

Nupcial

Minha música é céu

Lua

Natalina

Minha música é gral

Grão

Fatal

Minha música é sol

Luz

Carnaval

Minha música é rio

Rua

Real

Minha música não é minha

É sua!