Rei e Escravo

Sinto que já fui muito usado

Dos pescadores as lavadeiras

Já sendo fui imponente e cristalino

Límpido e brilhante, sem descanso

Hoje sou o barro e a mazela

Esquecido como aquele objeto usado

Usado como refugio de carros e corpos

Tratado, às vezes, mas sempre em descaso

Minha extensão merece um pouco de atenção

Corto o estado, ergo braços e irrigo planaltos

Fui vida, fiz vidas, fui sorridente, fiz sorrisos

Abracei os domingos sem televisão e hoje sou a visão

Da paisagem que não querem ver, da nostalgia esquecida

O presente em putrefação, o futuro prometido

Falaram que seria rei novamente, seria limpo

Tomaria posse das famílias, mas ledo engano

Não sou rei, nem vassalo, sou servo, sou escravo

Do engano e do descaso, do poder e do fracasso

Mas ei de erguer neste cerrado a minha grandeza

Serei meia ponte, imponente, com toda certeza