Últimas palavras
Enquanto a vizinhança
Pulsa em algazarras
Dentro de mim
Um império de silêncio existe
Imagino as pessoas
Em suas salas
Como escolas de samba
Sem abre-alas
Um vazio que não
Pode ser preenchido.
A noite desce sobre os meus cabelos
E a lua tímida
Se esconde atrás das nuvens
Tento salvar a inspiração
Que um dia tive
Primeiro passo:
Retirar dela a ferrugem.
Falar de amor?
Não quero!
Já estou farto!
Falar de dor?
Talvez...
É melhor não...
O meu cansaço
Já chegou ao nível mil
Estou carregando a carga
E o caminhão...
Pra aliviar o tédio
Que eu sentia
Cortei meus pés
E uma de minhas mãos...
Enfim...
Enfim...
Tantas ideias
Uma palavra
Deus me livre
Deus me cura
Deus me lavra
Sou plantação
De algodão puro
Imerso em praga...
Inceticidas já não basta
Bebo aos litros
Envenenar o meu sistema
É muito fácil
Meu coração não bate
É osso puro
Minhas artérias
Bombeando cálcio...
Meu parecer?
Parece que pareço
Pereço mesmo...
Já passei da validade...
Morri
Mas despistei
O pobre do coveiro
Que ainda hoje me procura
Na cidade...
Deixe minha tumba
Pra quem mais precisa
Muito imprecisa
Essa vida é um cais...
Faço questão apenas
Do epitáfio:
Mais do que isso não apodreço mais!