Pelo vento, pelo menos

Pelo vento pelo menos

-Como estás?

-Estou indo

E vou deixando levar

Sou leve, coração brando

E outras coisas me desprendem da matéria

Seja meu andar rastejante

Meu olhar réptil

Meu coração tropical

Plumas de outrora

Poeira de estrelas

E serei assim tudo isso?

Acho que sim, minha sina

Reunir, agregar, definir

No fim, tenho que ser leve

Não posso cair

E que me levem, vou atrás

Sigo rotas alteradas

Disparo coisas aleatórias

Escrevo parágrafos tortos

No chão de giz

E se o sopro for capaz

Hálito fresco, hortelã

Quiçá um chiclete mascado

Uma lufada maldita, um escarro

E minha leveza um dia juvenil

Foi mais um fardo

Sou assim e reflito!

Sou assim e não nego!

Finco minhas raízes, esbeltas

Não sou parasita, levo nomes

Tenho fama mas não dou autógrafo

Carrego coisas que não devia

Solfejo versos que não são meus

Já assinei trovas para quem não amo

Joguei flores a defuntos que não prezo

Prezei por animais e até humanos

Engoli chamas e espadas, hoje não quero

E se a vida que veio foi essa, levo

Chamam de loquaz e aceito

Na minha leveza serei floco de neve

Num alvejar alvissareiro

Trazendo frio passageiro

Negando chamas que são minhas

-O que é que há?

-É a vida

Ávida, ah vida!

Estou limitando os costumes

Cortando baratos

Delimitando territórios

Marcando meu espaço

Não quero da cova as medidas

Não serei o ninho de todos os pássaros

A pressão me toma cabeça e braços

Faltam-me espaço e abraços

Deixa a vida me levar...

Gabriel Amorim 20-04-2014