A janela dela
A janela dela
A janela dela
fatídica janela
dava pra manhã dourada
na parede nula
de outro prédio.
Dava pro asfalto
pra memória de corredores
da infância, casa nostálgica;
mil corredores imaginários
infinitos, azuis, turvos
A janela dela
dava pro corpo macio
da vista marítima;
pro vento satírico
que carrega vozes
da cidade metálica
que esquece de cansar.
dava pra indiferença
fria, talvez breve
em um estalar de lábio
A janela dela
dava para a plantação de concreto
pro carteiro banhado em suor
pro mendigo, distinto, ao sorrir
pra mercadorias transportadas
inconstantes, pra absorção do movimento
dava pra dinâmica do aborrecimento
cotidiano, de todos, dela mesma
dava pro encontro rubro dos namorados
tão antigo quanto a janela dela
A janela dela
raquítica janela
pintura errada de
uma vida a esmo.
Um convite que evapora
se não sumisse, recusaria.
A janela feita de suposições;
a janela da cicatriz;
se não fosse dela
de mais ninguém seria.
Seria ela a janela ?
ninguém saberia.