Um lindo poema: Da natureza das Coisas Lucrécio.

Da natureza das Coisas Lucrécio.

Estava de férias.

Em uma cidade.

Do Triangulo Mineiro.

Itapagipe.

Era verão.

Muito jovem.

Estudava Teologia.

Na cidade de Petrópolis.

Já era formado em Filosofia.

Apaixonado por Filologia.

Tinha poucos dias de férias.

Era seminarista.

E fazia o noviciado intermitente.

Naquele ano.

Seria no convento do Caraça.

Sempre adorei o Caraça.

Feliz porque estava indo.

Para o Caraça.

Fazer o noviciado.

Intermitente.

Então sentado.

Em um banco da praça.

Daquela cidade.

Quando surgiu.

Uma linda moça.

Minha amiga de infância.

Seminarista, seminarista.

Adoro conversar com você.

Venho a essa praça.

Para poder te ouvir.

Sei que estuda muito.

Até mesmo em suas férias.

Isso é verdade posso lhe dizer.

Estou aqui e vamos conversar.

Gostaria muito que falasse.

De algum filósofo importante.

Minha querida amiga.

Falarei a você.

De um velho poeta ocidental.

Interessante.

Inteligente e simples.

Ele afirmou categoricamente.

Em um grande poema.

Da Natureza das Coisas.

Que o universo é infinito.

Sem começo e sem fim.

Que não existe nenhum centro.

Para o próprio universo.

E que a terra é um planeta pequeno.

Sem grande significação.

Acho Lucrécio exuberante.

Como alguém poderia pensar desse modo.

Em um mundo completamente medíocre.

Lucrécio era ateu.

Não acreditava em deus.

Negava o pecado.

A moça peremptoriamente.

Perguntou ao seminarista.

Como pode um seminarista.

Acreditar em um poeta materialista.

Muito difícil você tem razão.

Mas também não acredito em pecado.

Céu ou inferno.

E sei que deus é uma fantasia.

Na imaginação do povo.

Como escreveu Lucrécio.

Não existe finalidade para o universo.

Para a vida.

Tudo é desprovido de sentido.

Não existe razão para ser nada.

Depois da morte refletiu Lucrécio.

O que restará ao corpo químico.

O seu lento desaparecimento.

Até dissolver completamente.

Na natureza, transformando nela mesma.

A alma é uma invenção.

Concordo plenamente com o senhor Lucrécio.

O homem quimicamente é igual.

A qualquer outro animal morto.

Quando morto não tem outra natureza.

A não ser o seu desaparecimento.

Nada existe depois da morte.

É como se a pessoa não tivesse existido.

A vida está esmagada sob a terra.

Presa as ilusões das religiões.

Diria também das ideologias políticas.

E de outras formas de metafísicas.

Os deuses não são responsáveis por nada.

Porque eles são criações ideológicas humanas.

Mas como você vai ser padre.

Pensando dessa forma.

Disse a eminente moça.

Eu sei que será muito difícil.

Não estudo apenas Lucrécio.

Gosto das ideias poéticas dele.

Mas estudo outros grandes sábios.

Entretanto, hoje falaremos de Lucrécio.

Em seu poema.

Da natureza das coisas.

Lucrécio afirma categoricamente.

O mundo não tem finalidade.

Também compartilho de tal proposição.

A vida não tem motivo de ser.

É muito triste lhe dizer essas coisas.

Mas elas são verdadeiras.

Não existem deuses a serem respeitados.

O que é certo ou errado.

São lógicas culturais.

Convencionais.

Tudo é apenas.

Convenções ideológicas.

Até mesmo a linguagem.

Não existe um modo certo de falar.

A certeza é ideologia.

A não ser um pouco o mundo empírico.

Penso desse modo.

Todos os conceitos são ideologias construídas.

Não existe um substrato fenomenológico da verdade.

A verdade do ponto de vista cultural é uma invenção.

Não existe nada objetivamente que devemos respeitar.

Eu digo mais até o Estado de Direito.

É uma ideologia política.

Uma construção cultural inventada.

Em benefício daqueles que levam vantagem.

Com o Estado de Direito.

Mas outras formas de Estados são piores.

Melhor escolher o Estado mais favorável ao homem.

Mas nenhum Estado é exatamente bom.

Para o homem.

Aceitação do Estado de Direito tem como objetivo.

Evitar a barbárie humana.

Apenas isso ilustríssima menina.

A moça apavorada suavemente.

Você é um seminarista atípico.

Interessante.

Não gosta de deus.

Não acredita na existência do diabo.

Nega o pecado.

E tem a mais absoluta certeza.

Da não existência da alma.

E diz clamente que a vida é absurda.

E que o melhor mesmo.

É a não existência de nada.

Que a única realidade possível.

Seria o infinito vazio e escuro.

Densamente frio produzindo gelo.

Interminavelmente preenchendo.

Todos os espaços vazios do infinito.

Mas estuda Teologia em Petrópolis.

Pertence a uma ordem religiosa.

Faz noviciado intermitente.

No convento do caraça.

E deseja ser padre.

Confesso que quando converso com você.

Fico desesperadamente confusa.

Quando volta ao convento.

Sonho todos os dias do ano.

Para poder te encontrar novamente.

Na praça dessa cidade.

E conversar com a vossa pessoa.

Coisas difíceis e incompreensíveis.

A minha lógica racional.

Nos verões de cada ano.

O resto do tempo.

Fico imaginando a vossa pessoa.

No convento rezando o breviário.

O seminarista riu.

Disse espero também as férias.

Para poder lhe comunicar.

Essas coisas exuberantes e cruéis.

As ideologias culturais humanas.

O meu desejo.

E poder ajudar libertar a vossa pessoa.

Da estupidez cultural.

Como muito bem disse Lucrécio.

Não existe finalidade para ninguém.

Porque não tem finalidade para o mundo.

Não existem regras para serem obdecidas.

Porque são ideologias culturais.

Não tem substrato que as sustentam.

Não existe castigo.

Muito menos punição após a morte.

Todas as punições resultam do poder político.

A maldição de certo modo é o Estado.

Menina você esta liberta.

Do mundo, do medo e das ideologias.

Liberta porque o homem não é nada.

Diz Lucrécio.

Não faz parte desse mundo.

Nem mesmo esse mundo faz parte de si.

Sábio é aquele.

Posso lhe afirmar categoricamente.

Que não se prende aos rituais.

Que ultrapassa ao tempo.

Que consegue viver.

Sem qualquer princípio como fundamento.

Libertar-se da moral sem ser imoral.

Da cultura sendo culto.

Ser vazio sem ser pequeno.

O homem é vazio do mesmo modo o universo.

O nosso único dever é sentir ausente.

De um mundo frio, sem início, princípio ou fim.

Esperando para aquele instante para não sermos.

Absolutamente nada.

A tarde finda querida menina.

Amanha volto ao convento do caraça.

Darei inicio ao meu noviciado.

Mas estarei aqui nessa praça.

No próximo ano.

Sentirei saudade da nossa conversa filosófica.

A moça triste apenas respondeu.

Acredito em você seminarista.

Mas tudo isso retira dos meus pés.

O próprio solo que devo pisar.

Fico no ar girando como um planeta.

Dos universos contínuos.

A diferença que não tenho eixo nos polos.

Para suportar a força gravitacional.

Em torno da minha própria pessoa.

Respondeu o seminarista.

Os eixos são imaginários.

Gire como se estivesse parada.

Exatamente a lógica do movimento.

Até o próximo verão.

Edjar Dias de Vasconcelos.

Edjar Dias de Vasconcelos
Enviado por Edjar Dias de Vasconcelos em 30/03/2014
Reeditado em 30/03/2014
Código do texto: T4749275
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