Vinho
Com o couro marcado a ferro em brasa,
Cruzamos alamedas ao aboio do tempo;
O sonho tem penas a saudade tem asas,
A marca é mui profunda embora rasa,
Pois diz qual afeto domina o pensamento...
Um pouco de pele ferida até se regenera,
O que escapa, não raro, é o colo do sono;
romance impensado qual a Bela e a fera,
esse toque itáctil de realidade e quimera,
que a cada desdita nos arranja novo dono...
o recuerdo do que poderia ter sido e gorou,
e nos faz ainda ciscar anseios no inútil ninho...
desengano, contudo, mata só o que matou,
o tempo testa homens, Cícero, acho, falou,
azedamos ou melhoramos, somos como vinho...