GUERRA E POESIA
Tirei poesia do fragor da guerra;
Do matraquear das metralhadoras,
Onde o ódio escorre das veias,
Pelos desencantos das bocas
E o sangue dissolve o pouco
Que ainda há de espírito.
Também a vi nas máquinas
Que colhem grãos e plantam
Multidão de ser e ais,
Quando criam cordões de desempregados.
Na escola ela era menina moça;
Saltitante e feliz; Sorria,
Desfolhava o inocente mal-me-quer.
Nos gritos de assalto. Alto!
Do alto do salto das madames,
Ao tênis rasgado da menina drogada;
Ou no salto alto da magrela na passarela.
Ali também passava ela.
Nas escarpas rochosas, da serra,
onde a serpente, sem piedade,
Devora os filhotes do pássarinho,
Que, muitas vezes, ainda está
Cantando, exaltando a alvorada.
Ah, tirei também poesia do estupro
Quando a terra é currada, coitada
Pela semente do veneno humano.
Dos rios que escorrem calmos,
Sem se importar se suas águas
São condenadas ou límpidas.
Porém, de onde mais tirei poesia
Foi do sorriso de uma criança
Filha da guerra africana.
Sorria. paupérrima e inocente,
Subnutrida de sonho, de comida
E do alimento do amor da gente.
Carlinhos Matogrosso