O Poema dos Tormentos

O POEMA DOS TORMENTOS

(Celismando Sodré – Mandinho)

Eu entendo os atormentados

E tenho um profundo respeito por eles

Porque também já sofri tormentos;

Penam demais esses nossos semelhantes

Quando perdem o chão que pisam

E caem num abismo de angústias,

Eles são reféns dos surtos psicológicos,

Vivem no limiar entre a luta pela sanidade plena

E a ameaça da loucura momentânea,

São escravos dos medos e das fobias,

Fantasmas que andam sempre a espreita

A esperarem o momento certo

Para o bote final, definitivo.

Compreendo cada vez mais essas almas desgarradas

Porque são perseguidas por uma sombra negra

Que se aproveitam das suas vulnerabilidades.

Alguns suportam as crises como uma cruz,

Que carregam como um fardo mais ou menos suportável

De acordo com a gravidade da situação de cada um,

Buscando subterfúgios existenciais

Como bálsamos para prosseguirem na vida,

Sem sucumbirem diante das ciladas armadas

A todo o tempo e em diversas formas por estes fantasmas.

A insônia está sempre no encalço

Dos atormentados e neuróticos,

E nos seus raros momentos de sonos,

Alguns são perseguidos por pesadelos sufocantes

Que os fazem acordarem sobressaltados.

Entendo os esquizofrênicos e bipolares,

Os hipocondríacos e transtornados mentais,

Todos carregam uma grande complexidade cerebral

Que faz parte de todos os seres humanos

Diante das agruras da existência.

Ninguém é assim porque quer,

E se for assim por conveniência

Corresponde ao mesmo sofrimento

Próprio de um desaprumo mental,

Porque só há felicidade no equilíbrio

Na serenidade, na harmonia e no amor.

Existem os pequenos e grandes tormentos na vida

E muitos gênios e inspirados da história,

Que foram incompreendidos no seu tempo,

Passaram por provações difíceis, as vezes terríveis,

Alguns sucumbiram e outros resistiram bravamente.

Penso nos tormentos de Jesus Cristo

Com sua fé inabalável e sua luz divina

Diante das tentações no deserto,

E a passar pela crucificação

Para salvar os pecados da humanidade.

Penso em Santo Agostinho a querer livrar-se do mal,

Ele que renovou o pensamento da Igreja

Interligando o platonismo e o cristianismo.

Os delírios de São João diante das revelações do apocalipse

Obra que ainda provoca tamanho assombramento.

Van Gogh a pintar seus quadros enigmáticos

Que revelariam muito da sua atormentada alma,

A decepar sua própria orelha

Devido a um amor não correspondido.

O matemático John Nash a ver pessoas imaginárias,

Ao mesmo tempo que usava sua poderosa mente

Para decifrar códigos de extrema complexidade

Numa capacidade que raríssimas pessoas possuem.

Nietzsche a reformular profundamente a filosofia

Questionando as bases da civilização ocidental,

Vagando de um lado para outro num manicômio.

Raul Seixas a compor belas e místicas canções

Flertando com a filosofia hinduísta e oriental,

Que como tantos artistas, músicos e intelectuais

Entregou-se a morte com o uso de drogas

Alucinógenos e outros entorpecentes.

Lima Barreto criticado e incompreendido

Pelos críticos do seu tempo,

A construir nos seus livros uma análise precisa

Da degradação social e humana em sua época.

O escritor Hernest Hemingway

Que depois que se tornou ícone da literatura americana,

Enfrentou a depressão com o álcool

Dando fim a sua própria vida com um tiro.

Beethoven e sua dupla personalidade

E sua belas melodias inspiradas e profundas.

O filósofo grego Diógenes (o cínico)

Renunciando as posses e riquezas materiais,

A ponto de viver dentro de um barril

Com sua lanterna a procurar um homem honesto.

E tantos outros, tantos outros que fizeram a diferença no mundo.

Entendo os que não se ajustam

Nas leis e costumes desta nossa sociedade

Muitas vezes hipócrita, injusta e cruel,

Os que deixam cair todas as máscaras

Mostrando como realmente são.

Entendo até os loucos

Com suas vidas reprimidas ou em delírios,

Tenho uma imensa compaixão por eles

Porque não carregam nenhuma culpa

Pelos males que acontecem no mundo.

Só não compreendo os psicopatas,

Que agem deliberadamente para prejudicar o próximo.

Os corruptos, bandidos e assassinos

Que arquitetam seus crimes e mortes

Sem demonstrarem quaisquer sentimentos de culpa,

Sem um mínimo de perturbação de consciência.

Os que racionalizam e banalizam o mal

Com suas inteligências acima da média,

Constroem e executam seus planos diabólicos

Matando e provocando sofrimentos,

Destruindo esperanças e sonhos,

Torturando e devastando por prazer

Com seus corações feitos de pedra bruta

De onde não se extrai qualquer sentimento.

Obs: Do próximo livro

MANDINHO
Enviado por MANDINHO em 18/09/2013
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