Amor e ego

Dedicou sua vida ao próprio ego

Mas eu o amo

Disse que fez tudo por nós

Ele não sabia que tinha um espelho na frente

Mas eu o amo

Não sabia

Assim como muitos outros

Que não é preciso ser arrogante ou ganancioso

Basta ser teimoso

Mas não era para si mesmo que tentou agradar

Porque ele tentou provar que conseguiria dar a volta por cima

E as décadas passaram

E estamos aqui, embaixo

Vivendo de agonia em agonia

Acreditando mais em milagres do que na realidade

Lamentando o que já aconteceu, o que não deu certo

Nossos pequenos grandes problemas,

Detalhes,

perto dos que estão em situações muito piores

E eu pensei que me ajudaria

Mas me cobrava pelo que não posso fazer

Lamentava pelo que ignorava sobre mim

Mas eu ainda o amo

Mesmo que eu tenha esse sentimento ambivalente

De chamá-lo de herói

E depois olhar para onde foi que ele nos trouxe

E eu só queria um diagnóstico

Uma explicação, mesmo que exagerada

Não queria esse remorso

Da culpa que eu nunca tive

Talvez nem ele tenha

Se somos tão pouco, quase nada

Se são poucos os que superam seus próprios preconceitos

Suas autoconcepções tão pobres

São poucos os que aprendem mais sobre os seus limites

Sobre o quão imperfeitos

Mas eu ainda o amo

Mesmo sem esse suporte

Mesmo nos meus rompantes de raiva e desprezo por ele

Por também sermos tão diferentes

Eu ainda o amo

Eu só queria que ele aprendesse o que eu aprendi

Não sei se resolveria alguma coisa

Mas acho que lhe traria mais paz de espírito

Ainda que tenha feito o que quis

Que tenha aproveitado sua vida

Porque eu o queria perto de mim nos próximos anos (eu queria que fôssemos eternos)

Justamente por amá-lo tanto

Mas o tempo implacável me fez voltar nessa poesia

Depois de sua morte prematura e inesperada

Para dizer: Eu te amo muito