ME PERDOO

Me perdoo por bateres no seu cachorro

por escutar na madrugada seu solitário choro

que faz um córrego se sentir pequeno

por te ver morrer no próprio veneno...

Me perdoo pelas barricadas que ergues ao redor de tua pessoa

por sua intransigente intransigência ao negar sua canoa

para alguém atravessar o mar da desesperança

enquanto dentro de si matas sua própria criança...

Me perdoo por sua neutralidade em assuntos tão urgentes

ímpios explodindo bombas e pais usando correntes

para aprisionar seus filhos que querem ir à escola

enquanto passas pela calçada e dá a última esmola...

Me perdoo pela cegueira que te acomete todo dia

ao jogar no lixo jornais e revistas e telas e rabiscos

ao se recusar a ler de tantos poetas alguma poesia

e só enxergares a pior parte do caramujo - o visgo...

Me perdoo por creres em carruagens celestes vindas do céu

e por dobrares os joelhos a homens que sem dizem pastores

e por tentares matar as abelhas - as únicas a fazerem o mel

e por obnubilar sua mente com bíblias de falsos doutores...

Me perdoo por teres aceito a condição humana sem lutar

contra as leis de servidão e escravatura que dominam o mundo

por teres se curvado aos cetros de reis loucos que vivem de imperar

e teres te levado à mais desumana condição no teu eu profundo...