Boêmio Careta

Quando o sol termina seu ato

Deslizo pelas ruas de pedra e de asfalto

O reduto onde mora a boemia;

Quando esvai-se a luz do dia

É lá o meu lugar.

Aboleto num balcão ou numa mesa de botequim

Não tenho navalha . . . Minha arma é o bojo em pinho

Por onde faz-se ecoar toda a malandragem

Que corre em minhas veias. . . Simplesmente por profissão.

Sou profano de fé, poeta porreta

Porém sou mitificado

Por alguns discriminado

Por ser um boêmio careta.

O que posso fazer ?

É questão de opção

Mas a noite também é a minha paixão.

Me embriago de samba , seresta e violão

A soda e o sereno me refrescam no verão.

A cada tragada de conversa fiada

Uma baforada de papo furado

Garçom . . . Mais uma rodada de samba canção . . .

Se quero algo mais forte

Recorro ao samba de quadra ou samba exaltação.

Mas hoje canto abraçado à melancolia

Saudades de um dia

Que se perdeu na névoa do tempo

Virou só nostalgia . . . Virou o pó que me causa torpor.

Pra tentar esquecer

Tasco uma amarga dose de alegria

Que queima goela acima

Fazendo novamente me entorpecer de ilusão

Através da aprazível audição

Que logo aquece o coração.

Aí saco um verso dolente

Escorrego um passo insolente

Desabafo num choro contente.

O pranto que é enxugado e o brado que é abafado

No velho linho amarrotado,

Companheiro de saraus e gafieiras . . .

Nas terças e sextas-feiras . . .

Regados a maliciosos bailados

Puladinho e pião. . . Espaguete e cruzado.

A voz da satisfação

Que soa da percussão das mãos,

Prediz os acordes derradeiros . . .

Ahhhh . . .

A atmosfera anuncia que já é hora de partir,

A alvorada está porvir.

Sigo o caminho regresso na ponta dos pés;

Pois a natureza, preguiçosa . . . Ainda dorme

Então de saideira . . . A sinfonia dos grilos, pra mim basta.

Vou sem rumo . . . Sem demora

Adormecer . . . Até o rematar d´aurora.