Ensina-me como deixar de pensar (ou O Cruzado)

Contei-me em noites pelo deserto

E o vício, não longe, de tão perto

Não findara acalentar

Surgiam luas, passaram dias

E eu, errando em brumas frias

Ainda estulto, continuava a vos amar

Meu corpo, granítico em áridas noites

Não reclamava, ó Deus, dos vossos açoites

Sôfrego esquecimento, impossível de clamar

Recordava-me imerso em batalhas

Donde à vida a morte emana

Sangue, tripas, presentes de navalha!

Cimitarra! Presteza que minha alma inflama

Brados ecoavam pelos campos

Oníricas bandeiras, imanes rajadas

Donde a vida tange a falha

E o erro, exala o pranto

Eis em guerra o que vejo

Lugar, em que a fúria arde em medo

E quem vence é sempre santo

Diz-me, ó Deus das causas justas

Se não vedes o que vejo perante o céu

Quem és tu, alma iníqua, para perdoar o infiel?

De que valem pequenas abusas

Se o teu ser, arde em fel?

Exaspero-me em vossos mandamentos

Não, não quero mais ser um cruzado

Tombo, saturado em tormentos

Pois Cristo, ó Deus, possui coração ávido

Deslembrar-te eu quero, mas, me diz:

“Por que ainda sou tua meretriz?”

O sono da razão produz monstros

Mas, seu despertar não afaga sentimento

Coisas de mau amor que faz ferir

E que não susta um só momento

Ai daquele que pensar em pensamento

Que por aí há maior pensar que o sentir

Dionísio niilista
Enviado por Dionísio niilista em 24/03/2008
Código do texto: T913858