CONTINUO O DIA, VAGAROSO.
Como se tudo ocorresse
de acordo para dar errado:
após o sol fervente,
um cão corre atrás de mim.
Tento me desvencilhar,
não dou atenção,
até que o animal
morde de raspão minha perna.
Na hora, algo sobe.
O sangue ferve no exato momento.
Eu então torno a ser
outro ser.
Penso mais que rápido,
a mudança em questão de segundos.
Chuto-o com toda força
enquanto acelero a moto, ziguezagueando.
Por fim, ele se afasta
— acho realmente que acertei em cheio,
pois ele não late mais.
Então dobra a rua
e some.
Fico fervendo por dentro,
querendo vê-lo,
chutá-lo,
correr atrás dele,
latir e rosnar mais alto.
Mas não consigo.
Não há mais cão,
não há mais corrida,
nem a necessidade de agir.
Estou furioso,
pensante demais
para quem está abaixo do sol escaldante,
impetuoso.
Então a poeira baixa.
Me direciono para o mercado.
Ao chegar na rodovia,
o pensamento muda.
Agora penso no cão
e na força do chute,
mesmo sendo este
para me autoproteger.
Penso na dor,
nos motivos para latir
— quem sabe ele estava zangado?
Ou querendo apenas brincar?
Sinto-me agora a pior pessoa do mundo.
Sinto que sou sujo.
Fiz mal ao pobre animal.
Sinto-me triste e culpado.
Culpa essa, dado o veredito
por meu juízo interno,
onde sou condenado,
sendo meu próprio carrasco.
Sinto isso tudo.
Penso: por que sou assim?
Então divago, perdido
— preciso de um novo carregador,
o meu já está com mal contato.
Penso em algo mais urgente,
penso que preciso de uma camisa nova,
penso em abastecer a moto.
Esqueço o cão.
Sigo divagando
Mais um dia vagaroso.
© [2025], Lucas E. P. Monteiro.
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