Se Você Viesse

Se você viesse

Sentaria em um banco de praça

E num momento de silêncio viria a rir também

Percebendo as ruas quebradas, imperfeitas

Mesmo que, ricas por natureza, num país diferente demais

Longe demais

E todas as pessoas passando

Pessoas indo, pessoas voltando

Os rostos pálidos a meia-noite

Enormes buracos negros que circundam seus olhos

A curva, a corcunda

O suspiro

Ahh...

E então, do outro lado da mesma rua

O bêbado soluçando, rindo

De cara vermelha, vendo as coisas inexistentes

E se viesse e passasse a imaginar que a felicidade não está na rua em que todos seguem marchando

E se pergunta a quem está na frente, eles dizem: eu também estou esperando

Esperando a minha vez

A minha vida chegar

Mas já não vive?

Não até ver o que há no fim da fila

E se for um buraco?

Buraco? Que bobagem! Estão todos indo pra lá

E então fica quieta. Se aborrece.

As vezes parece descolada do mundo

Da fina parede que divide o um do todo

As vezes parece estar mais longe que Berlim

Marte, Netuno, Plutão...

E não há um só tostão em meus bolsos

Mas de sorrisos, posso dizer que estou cheio

Sorrisos doloridos

Por isso eu digo, se viesse pra cá

Porque mesmo aqui parece distante

Menina Marfim

Talvez quisesse ir cedo, pra nunca mais incomodar ninguém

Mas se fosse eu iria junto

Que mundo sem graça esse

Sem a Menina Marfim

Mas até onde o corpo acompanha o que a cabeça tem a dizer?

Ou, quer dizer, até onde a alma acompanha o que a cabeça manda e dita?

Se você viesse

Pediria desculpas pela vergonha

De ver esse pedaço de mundo acabado

Que nascemos, vivemos e passamos a chamar de casa

Este pedaço de nada

Se você viesse

Pediria desculpa pela vergonha

De não poder sair tanto por não querer me matar de trabalhar pra ganhar e gastar

Elevar a miséria e retornar pra casa

Fadado ao fracasso

Todos os dias

Se você viesse

Acho que não conseguiria olhar no teu rosto

Por vergonha de não ser nem metade do que prometi

De não ter nem metade do que quis

E de não investir

Naquilo que me faz feliz

Você pergunta como vão as coisas

Eu digo ehh... bem, você também

E ficamos quietos

Não a nada a ser dito

Escravos de suas próprias cabeças

Seus próprios motivos

E se há uma coisa boa a tirar de tudo isso

É que se você viesse...

Me faria bem feliz.