A forma do Eu

Não sou lento

Mas sim, detalhista

Movo minhas raízes no solo transitório

Ora escasso, raso, destituído de saberes protetores

Ora alagado, confinado em cada centímetro cúbico

A estação é sempre a mesma

Crio o sonho, e deste mesmo

Nasço, pai ainda

De um mundo quebradiço

Efervescente na caricatura do meu sorriso

Nos nós dos meus dedos

Na minha pele, escama descascada

E em maior parte, na inconsciência

Coisinha fina, leve no permear

Quase óssea, mas flutuante sob a esvaziada caixa rosácea

Que talvez te guie

Não sou, e jamais serei, genial

O conhecimento gravitando em mim

Circular, rijo, expansão em linha reta

Mantenho, de fato, meus ouvidos atentos

Seguindo o clamor da sabedoria

Que ruge ubíqua em seus milênios inabaláveis

Quiçá serei um sábio, então

Absorvo a melodia do silêncio

Aprecio a harmonia do dissonante

Sonoridades tão delicadas

E que se espalham em mim

Em você, também

Cada nota tocada, terminada

Em uma sinfonia diferente

Atingindo a nota uníssona

Do espetáculo final

Eu não sou

Não sou Deus, translúcido

Claro à visão de toda a gente e bicho

Múltiplo nos espelhos e águas

Que tanto turvam a vida

Eu não sou, e justamente ao não ser

É que assinalo as partes que são em mim

Miúdas, fundas, cortantes

Eu sou...

Eu sou eu