Poética: Medusa - a escultura

"Mergulhada em meus afetos, anseio apagar-me, pois a minha vida é anterior a mim em seu substrato histórico, e os meus olhos são demasiado fundos para permitir-me tanger o chão de quem eu sou."

Nas lacunas da minha fala escoa o silêncio, e nele conglomerados se amontoam e apontam a ausência de mim em meu rosto.

Entranho-me em meus sentimentos embotados e eles se expelem em forma de rosas estranhas brotando da pele.

Eu não queria rosas, mas quando algo entra em meus pensamentos, afunda nas movediças camadas do meu ser sem encontrar saída, a não ser respirando-me em aromas e espinhos.

Rosas são minha necessidade oculta de ser explicita e exalar tudo o que me compõe em matéria estrangeira a mim.

Do cutâneo então, descama-se o âmago

e dele raspo a matéria invasiva do tempo - O ar é espiralante e cíclico enquanto troco de pele -

Cá estou eu rastejando numa iminência que floresce-me para fora das misérias petrificantes da humanidade -

"Caveiras da fome riem para o nada enquanto transtornos são satirizados em rituais onde dores são expostas como em circos de anomalias internas."

- E de certo quero estar ás margens disso, quero conceber a humanidade como estátua que fosse viva, transgredindo-a e superando-a em arte.

Deslizo os dedos buscando entendê-la, mas aos poucos sinto-me fustigada e engessada de tanto fitar teu ventre e esculpir tua forma.

Céus, sem perceber me misturei a obra ao espelhá-la em meus olhos e agora reflito os horrores da existência adornados em eternidades e belezas que assombram o meu vazio com esperança.

- Letícia Sales

Instagram literário: @hecate533

Letícia Sales
Enviado por Letícia Sales em 01/01/2024
Código do texto: T7966893
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