Olha como, cortando os leves ares,

Passam do vale ao monte as andorinhas;

Vão pousar na verdura dos palmares,

Que, à tarde, cobre transparente véu;

Voam também como essas avezinhas

Meus sombrios, meus tristes pensamentos;

Zombam da fúria dos contrários ventos,

Fogem da terra, acercam-se do céu.

 

Porque o céu é também aquela estância

Onde respira a doce criatura,

Filha do nosso amor, sonho da infância,

Pensamento dos dias juvenis.

 

Lá, como esquiva flor, formosa e pura,

Vives tu escondida entre a folhagem,

Ó rainha do ermo, ó fresca imagem

Dos meus sonhos de amor calmo e feliz!

 

Vão para aquela estância enamorados,

Os pensamentos de minh'alma ansiosa;

Vão contar-lhe os meus dias gozados

E estas noites de lágrimas e dor.

 

Na tua fronte pousarão, mimosa,

Como as aves no cimo da palmeira,

Dizendo aos ecos a canção primeira

De um livro escrito pela mão do amor.

 

Dirão também como conservo ainda

No fundo de minh'alma essa lembrança

De tua imagem vaporosa e linda,

Único alento que me prende aqui.

 

E dirão mais que estrelas de esperança

Enchem a escuridão das noites minhas.

Como sobem ao monte as andorinhas,

Meus pensamentos voam para ti.