LISBOA DE FERNANDO PESSOA (II)

Paris de Baudelaire;

Praga de Kafka;

Dublin de Joyce;

Alexandria de Kaváfis;

Buenos Aires de Borges;

Trieste de Italo Svevo

E de Umberto Saba;

Lisboa de Fernando Pessoa...

Lisboa.

Não esta Lisboa por cujas ruas caminho

Um século depois de Fernando Pessoa

E à qual cheguei

Num avião da TAP

E onde há pouco tirei

Uma fotografia ao lado

Da estátua do Poeta

No Café A Brasileira do Chiado,

Mas a Lisboa de há um século,

Em que o próprio Poeta

Caminhava com seus heterónimos

Ou, em uma palavra,

A Lisboa de Fernando Pessoa.

Lisboa de Fernando Pessoa

E de todas as demais pessoas

Que nele viviam...

Lisboa que vi pela primeira vez

Do mar, num grande navio

De antigamente, num amplo

Paquete a vapor

De tempos que já lá vão

E que vive na minha saudade

E naquela de meus heterônimos

Que a viram

Ou que nela viveram

Ou vivem.

Lisboa! Oh, Lisboa!

Oh, Lisboa de Fernando Pessoa!

Lisboa que avistei ao longe

Do convés do velho navio

Em que viajava a sonhar,

Viandante inútil de mim mesmo

E do mundo,

E que diante de meus olhos se ergueu

E na saudade ainda se ergue

Como uma bela visão de sonho,

Sobressaindo contra o vivo azul do Céu

Que o áureo sol animava

E na saudade ainda anima.

Lisboa! Oh, Lisboa de Fernando Pessoa

E também de seus heterónimos!

Lisboa onde conheci o Poeta

E com ele conversei

No Café A Brasileira do Chiado

E no Martinho da Arcada

E onde também conheci

O semi-heterónimo Bernardo Soares

E o heterónimo Álvaro de Campos,

Que me levou a passear

Num Chevrolet pela estrada de Sintra

E me disse que, como eu,

Não era nada,

Nunca seria nada

E não podia querer ser nada,

Mas, à parte isso,

Tinha em si todos os sonhos do mundo.

Lisboa! Oh, Lisboa de Fernando Pessoa,

Onde sou amigo do Poeta

E tenho a bagaceira que eu quero

No copo que escolherei!

Oh, Lisboa de Fernando Pessoa,

Cidade de sonho e de saudade

Para onde digo que vou,

Como Manuel Bandeira dizia

Que ia p'ra Pasárgada

E onde sonho com o Quinto Império

A caminhar pelas ruas

Do Chiado e da Alfama!

Oh, Lisboa de Fernando Pessoa

E de Álvaro de Campos!

Lisboa das casas de várias cores!

Lisboa para onde talvez regresse

Numa manhã de nevoeiro

Qual outro D. Sebastião.

Lisboa! Oh, Lisboa de Fernando Pessoa

E também minha

E de muitos de meus heterónimos

E que vive na minha'alma

E é eterna no meu sonho

E na minha saudade!

Victor Emanuel Vilela Barbuy.

Lisboa, 4 de agosto de 2023.