O livre-arbítrio é uma ilusão - Coletânea
Restrito-arbítrio
As verdades são sempre parciais
Uma transcende a outra e abarca
Na sucessão de eventos naturais
Em que novo paradigma demarca
Em bravio oceano de hormônios
Ao sabor dos ventos navegamos
Tripulados por nossos neurônios
Em viagem que nem imaginamos
Eventos acontecem alheios a nós
Há um entrelaçamento dos fatos
Que faz de cada um anjo ou algoz
Em palcos concretos ou abstratos
Integramos o processo evolutivo
A trama cósmica impõe o conflito
Todo comportamento é instintivo
No qual o arbítrio é muito restrito.
Autômatos
Não me arrependo do que fiz
As escolhas não foram minhas
Nunca fui dono do meu nariz
E muito menos das entrelinhas
Meu livre-arbítrio é uma ilusão
Sucumbo a inúmeras pressões
Sigo os sussurros da intuição
Não são autorais tais opiniões
À deriva no mar de hormônios
Ajo como agem os estômatos
Pela electricidade dos axônios
Que impulsiona os autômatos.
Pressões
A bioquímica nos pressiona
Provoca variações hormonais
Energiza ou nos leva à lona
Faz-nos agir como irracionais
A genética determina aptidão
A moda nos impõe o vestuário
O coração nos rouba a razão
O destino pode ser hereditário
Crenças religiosas norteiam
O código moral impõe conduta
Fatores que tudo permeiam
Mas não há vontade absoluta
Nosso livre-arbítrio é ilusão
Não são autorais estas opiniões
E seguimos ainda a intuição
Rendemos a inúmeras pressões.
Alheios
De repente aqui estamos
Sem sabermos de onde viemos
Menos para onde vamos
Nem por que tanto sofremos
Não somos o que dizemos
Tudo o que nos acontece
Nem sempre escolhemos
Todo dia por si amanhece
Tão ínfimo é o nosso poder
Somos apenas instrumentos
Não donos do nosso querer
Pois este vem do firmamento
Somos repositórios do saber
Todo conhecimento já existe
À revelia tudo irá acontecer
Pois é em que o mundo consiste.
As Coisas Acontecem
Desde uma partícula subatômica
Até a maior de todas as estrelas
Tudo está em frenética dinâmica
Forças agem sem se percebê-las
Coisas acontecem alheias a nós
D'algum poder somos detentores
O qual nos garante a vez e a voz
Porém nunca plenos condutores
Somos uma resultante de forças
Dentre elas está a nossa vontade
Que evita as situações insossas
Dando sentido à nossa realidade
As coisas acontecem com todos
Islâmico, judeu, cristão ou ateu
Samaritanos, fariseus e engodos
Nobre, rico, pobre, rei ou plebeu
Que cada qual assuma a sua culpa
Não transfira ao diabo ou a Deus
A qualquer outra entidade oculta
Que possa justificar os erros seus.
Algoritmos
Seres vivos são algoritmos orgânicos
São sequências lógicas de instruções
Pelos programas quântico-mecânicos
Que determinam os eventos e ações
Os algoritmos bioquímicos orgânicos
Determinam nosso estado de espírito
Nos fazem agressivos ou românticos
Ao executarem o programa prescrito
Já genomas são algoritmos genéticos
Determinam características dos seres
Por espontâneos programas ecléticos
Que exercem seus fantásticos poderes
O cósmos se serve destes algoritmos
Para executar os programas criativos
Que impõem os movimentos e ritmos
E às criações aspectos de seres vivos.
Nossas Escolhas
Estamos todos conectados a tudo
E a todos afetam nossas escolhas
Não temos nehum infalível escudo
Não somos confinados em bolhas
Dotados de livre arbítrio para ir e vir
Decidimos o que comer, como vestir
Também o que fazer, falar ou ouvir
Seguir, voltar ou até mesmo desistir
Somos co-autores da trama da vida
Ora à deriva num mar de hormônios
Em uma tão atroz guerra descabida
Que atribuem aos nossos demônios
Qualquer que seja a nossa decisão
Haverá inevitáveis desdobramentos
Que nem tão intricados o parecerão
Neste turbilhão de acontecimentos.
Há Quem Faça
E surpreender-se-á consigo
Irá agir no exato momento
Porque virão em seu abrigo
A coragem e discernimento
Há quem se arvora ser Deus
Há quem alheio siga a massa
Há os samaritanos e fariseus
Há quem boas causas abraça
A ansiedade é nociva à saúde
Não se dá o que não se tem
Avalie a sua eventual atitude
Antes de fazer suposto bem
Um cósmico propósito existe
Fazemos parte deste projeto
Em executá-lo a vida consiste
Confie no cósmico arquiteto!
Sem apologia do comodismo
Pela cabeça isso não me passa
Sem evocar o determinismo
Se você não faz, há quem faça
Insignificância
Da poeira cósmica sou uma partícula
Por isso recolho-me à insignificância
O ser humano, na presunção ridícula,
Dá-se então a indevida importância
Somos mais um produto da evolução
Mas há quem se arvore ser um Deus
Por ser desprovido de alguma noção
Tudo gira em torno de si ou dos seus
Que se calce a sandália da humildade
E que se coloque no seu devido lugar
Integrante do universo a humanidade
Apenas uma consciente poeira estelar.
Sina
Às escolhas sigo a sina
Feito o veleiro ao vento
A vida a que se destina
Não é por merecimento
Outra é a lei do destino
Sem propósito e projeto
Como evento repentino
A esta lei não cabe veto
A natureza nos é hostil
Mas também provedora
Tão violenta e tão gentil
É de toda vida criadora
O importante é a beleza
Reverenciada em verso
Celebração da natureza
A artífice deste universo.