Ó Negro véu.

Ó NEGRO VÉU !

Ó céu que à noite vindes negro em grosso véu,

Cobrir-me aos olhos que buscavam entre ilusões,

Achar estrelas cintilantes de esperanças,

Pra amenizar o coração, perdido ao léu,

Batendo a esmo, solitário e sem razões,

Sem ter escolha, ao surgirem essas lembranças!

Justifique-me porque quem aí se esconde,

Ao raptar todo o amor de minha vida,

Inda tortura pelas horas do destino,

Com a solidão que vai chegando, nem sei donde,

Trazendo a dor que deveria, se esquecida,

Acalentar-me, com a crença, eu imagino!

Ó céu que à noite vindes negro em grosso véu,

Roubando a lua, minha musa em serenata,

Que faço à imagem do retrato em minha mão,

Cuja beleza me mantém um eterno réu,

Daquele amor, tal qual estrelas que em cascata,

Invadem o mar, como em meu peito, a oração!

Vê se respondes porque levo esse castigo,

Por essa vida sem razão, que vou tocando,

Qual violão que em seus acordes de lamento,

Tange na alma, as lamúrias de um mendigo,

Que a ti pediu, por piedade, implorando,

Poupar-lhe a dor, do inevitável, do momento!

Ó céu que à noite vindes negro em grosso véu,

Enigmático, insensível e duvidoso,

Porque me ocultas a razão, se ela existe,

Pra extorquir o amor fiel, deixar-me aréu,

Com todo o tempo, que me fez agora idoso,

Curvar-me à fé, mesmo sem crer, porque insistes!

Se, em vossas mãos onipotentes há destinos,

Se nos liberta pensamentos e prazeres,

Porque nas missas ao pedir-te penitência,

Ignoraste-me quando ao badalar dos sinos,

Rezava em prantos, e vós, tinhas tantos afazeres?

Que justificasse me brindar com vossa ausência?

Ó céu que à noite vindes negro em grosso véu,

Trazer-me a luz da madrugada enluarada,

Clareie as trilhas onde existam esperanças,

Que amenizem tanta dor acumulada,

Pra que eu sinta dentro d’alma a fé, sem fel,

E então perceba que há sorrisos nas crianças!

Mas se não fordes nem capaz de isso dar-me,

A simples crença que existes, que sois verdade,

E insistirdes em castigar-me com a saudade,

Vou com revolta, certamente sepultar-me,

Cético sim, perante a dúvida, no adeus,

Pedindo paz, também perdão, ó grande Deus!