DUAS VIDAS

“Temos todos duas vidas” – Álvaro de Campos.

Na noite outonal

O nevoeiro desceu

Sobre a Montanha

E cobriu o céu

Com seu gélido manto de arminho.

Temos todos duas vidas:

Aquela que as crianças que fomos

Sonharam que teríamos

E a que temos

E que nunca é igual

À que aqueles que fomos

Nas auroras de nossas vidas

Sonharam que teríamos

E que por vezes temos

Numa grande saudade

Do que deveria ter sido.

Temos todos duas vidas:

Aquela em que somos

O que as crianças que fomos

Sonharam que seríamos

E aquela em que somos

Algo mais próximo

Do que de fato somos

E que nunca é igual

Àquilo que aqueles que fomos

No dealbar da existência

Sonharam que seríamos

E que por vezes somos

Numa grande saudade

Do que deveríamos ter sido.

Temos todos duas vidas:

A que os outros que fomos

Sonharam que teríamos

E falhamos em ter

E a que temos

E nunca é igual à sonhada

No alvorecer da peregrinação terrena

E vivida por quem fomos,

Na sua saudade do futuro esperado,

E por quem somos

Na nossa saudade do que deveria ter sido

E do que deveríamos ter sido.

Ah! dor de não ser poeta

Para escrever a história do que deveria ter sido

E as memórias que eu teria escrito

Se fosse o que deveria ter sido...

Victor Emanuel Vilela Barbuy, Campos do Jordão, 27 de maio de 2016.