Sarau
Queria do anoitecer um atraso
De repente uma melancolia
Não devia ser culpa do ocaso,
Mas é certo que ele contribuía
Pensamentos sombrios são convidados especiais
A noite é um belo anfitrião de fantasmas
Dá recheio a nossos medos ancestrais
Ganha cor e volume seu ectoplasma
Mas antes de se enveredar na tristeza
Eis que um anjo na forma de um sabiá
Ciscava o chão a meio metro para sua surpresa
Como se uma mensagem quisesse passar
Filosofou onde estaria seu medo
Tão frágil e indefeso passarinho
Já na hora de se recolher num arvoredo
Das suas paranoias atrapalhava o caminho
Fazia lembrar citações da bíblia
“não plantam nem colhem...”
Para os fracos, alento para sua desídia
Crer que tem quem acredita no valor do homem
Pensou que o segredo estava no viver o agora
Pássaros não fazem planos para o futuro
A preocupação nunca será senhora
E “descanso” será o único significado de escuro
Pensou na vida e suas múltiplas possibilidades
Parece que o sabiá lia seus pensamentos e o encarou
Ficou meio envergonhado olhando para a ave
Podia jurar que viu ela piscar quando voou
Olhou para o céu com outras lentes
Já começavam a despontar as primeiras estrelas
Da sua boca começaram a surgir os dentes
Era bom estar vivo e acordado para vê-las
E os fantasmas? Bom, estes ficaram esquecidos
Repleta de convidados alto astral a dançar,
Que celebravam um coração agradecido
A festa que rolava não tinha hora para acabar