Coração de Poeta

Não se vê o coração sincero do homem,

O sentimento infindo assim se ignora:

O amor que é terno eternamente adora,

Muitas belezas que aos olhos somem.

Por isso canta o poeta em desespero,

E sua canção ameniza a dor sem fim...

Ao além da razão o vate diz sim

E então escreve com alma, sangue e esmero.

E, nesse turbilhão irracional, surge

O mais essencial, não enunciado ainda,

O primado do real que nunca finda,

O esquecido do qual a poesia urge.

O poema dá voz à própria Esperança

De juntar os destroços do coração

E acreditar que o amor não é em vão,

Mas uma plenitude que se alcança.

O poeta, esse ser tão paradoxal,

Que ama demais sonhando, vive e morre.

Para quem a tragédia d'alma ocorre,

Sendo a Felicidade o aceno final.

É pássaro e, portanto, canta e voa —

É existência fecunda e pulsante,

Seu cantar de vida e morte é pujante,

Sua poesia é dor para que não doa!

Do coração a ouvir veras razões,

Medita com o cérebro angustiado...

Amar sem fim e porquê é seu fado,

Estar cego, mas ter tantas visões!

E, ao paradoxo de uma epifania,

Abisma-se o vate nas trevas da noite...

Sentindo que a consciência é o açoite

Lançando à natureza a luz do dia.