Não ser

Eu desacato o devir dos tempos

Por minha inequívoca insatisfação,

Pois tão diminuta é sua fração,

Para a vida que detém pensamentos.

Assim, não tenho qualquer gratidão,

Pelo compasso do minuto em minha mão,

Por estar entre aqui e ali, relutante,

Pois o preço de um instante é outro instante.

Visto pois, que não se cobra da flor a beleza

Só por ela petulantemente ter brotado.

Tão pouco exigimos do amor a certeza,

De certamente ter sido amado.

Então, por que no viver encontra-se o fim?

No insistente nascer de cada dia,

Há sempre um dia a menos de mim.

Desfazer-se da pele, do corpo, da alma, assim?

Enfim, no inevitável desnudar-se do ser,

Neste insensível e supérfluo perecer,

Encontra-se o único acalanto do sucumbir,

O que não existe não pode mais se extinguir.