Poemagrafia.

Não, não tenho um milhão de quinquilharias de diplomas ou cursos de escrita.
Não sou graduado ou mestrado,
não sou limitado a nada.

Sou o escritor,
uso tudo o que passei pra sangrar em cima dessas páginas cor de vinho,
e transmitir o roto, a melancolia e a decisão
de que sempre vale a pena
continuar mais um dia que seja.

Sou o rosto de quem quer ter um espelho,
sou reflexo da insônia, da perturbação,
da ingenuidade contemplada em meu ser.
Não escrevo o que nunca passei.

Conheço todos os finais,
os dias do ano e todas as respostas.
Conheço todas as perguntas, mentiras e enganos.

Sei cada buraco que pisei
e mulheres que nunca mais verei.
De casas que entrei e saí,
de moinhos que nunca giravam sem mim.

Meu lugar é no passado
ouvindo os dias voltarem
enquanto escuto o sereno gelado cai sobre o telhado do meu quarto,
escorrendo pela calha,
até bater em uma balde, fazendo um som peculiar.

Um som como o fogo,
que te hipnotiza e você quer ficar olhando sem motivo.
E sem razão nenhuma o mesmo se apaga,
como um sonho,
e no final apenas você só está mijado em sua própria cama,
sem nenhum problema a mais.
Imensamente sozinho.

Não tenho muito o que pendurar na parede,
só alguns quadros e placas antigas,
um porta-chaves e um carpete que empoeira
por qualquer sola de sapato.
E isso me torna o suficiente, não sou currículo,
não sou modelo,
nem de rosto,
nem de corpo,
nem de exemplo.
Sou escritor.
São palavras que me definem, não pessoas.

Meu lugar é no passado, ouvindo discos de vinil,
sentindo calor do asfalto, tomando vinho barato.

Temos idade e data pra morrer.

E essa caneta... escrevo e a tinta nunca acaba.
Ela nunca acaba.
Nunca.

E nós morremos...
mas ela nunca acaba.

Poema da obra: Madrugada adentro como essas, costumam me puxar pelos calcanhares todas as noites.
 
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