A mulher de 24
Vou sobrevivendo aos vômitos de angústia
É sobre viver que a gente conversa
Eu-ela, no sanitário das moscas
Uma mulher de 24 anos que fala
com outra mulher de 24 anos
que ela encara no espelho.
Duas amêndoas incertas
O dente canino num amarelo febril
Os seios, desilusórios.
A mão na mão estilhaçada da outra
Odeio lembrar que o que eu digo não marca
odeio dizer que o que sei, outros sabem
Sabem mais, e melhor e mais preciso
Odeio dizer que eu preciso de terapia de plantas
E mais ainda que o transtorno que tenho é responsabilidade minha
E que o suor escorregadio
Traduz meus anseios de morrer na fogueira da mente
Eu, ela, 24 anos
E ainda me deixo sugar pela cama
Ainda passo horas escrevendo e apagando neuroses
Odeio dizer
Estou um pouco bem cansada
E que cada palavra que uso e acho importante, não faria falta.
Deitei no chão num zum zum pós almoço
deixei de rimar faz muito tempo
Deitei ouvindo a voz me dizer
Que eu tenho um eu
e outro eu
e outro eu
e legiões malditas
Mas quero o limão da cozinha
O sal indisposto, nem sempre grosso
A união da poesia com o exageiro
Porque a hipérbole me traduz
Mais que a metáfora
Estou um pouco olhativa
Enigmatizante
Transbordona pelas bordas do piso
Ilustrativa
Ponderante
Filosófica, e por isto mesmo ousada
Estou um pouco freudiana
Um pouco espiritualizada
Com mentores soprando seco ao pé dos meus cabelos
Estou um pouco
Deixe-me estar
Let-it be like in the Beatles song
Pare de me socar resposta
Estou um pouco indisposta
Estou um pouco
Deixe-me estar
Deixe-me
Estou um pouco bem exausta
Estamos, eu e ela.