A ópera prometeica
Meu crânio outrora fatigava ao léu vespertino,
Bem me lembro, minhas ideias escoavam pelo céu, na rutilância obscena de uma hemorragia.
Nas funduras do meu ser, algo rompia,
o por do sol era a minha sangria, que de tanto
congestionar, manchou a atmosfera em mais
um apocalipse diurno.
Cá estou eu, produto do esvaziamento existencial;
Do meu sangue jorrado, os esmeros coágulos da insatisfação
operam na distância atmosférica.
Oh sim, nada é mais pesado que o céu ensanguentado,
É pra lá que os meus pensamentos vazam quando não cabem mais em mim.
Numa ode anuviada, sinto o hálito castiçal na epigênese de certos pulmões soterrados,
O cheiro matutino, agora putresce no barro molhado da tarde;
Essa é a madureza da vida.
Pois algo ainda respira nas entranhas da terra,
mesmo após o sol decompor e entardecer todas
as sementes plantadas durante a aurora;
A tarde é a força decrépita da manhã
regada a sangue.
Já não posso sustentar o peso dos ossos que se formam da argila craniana;
Epimeteu é a minha força criacionista,
Vive por dar formas aos meus acúmulos mentais, mas já não posso suportar tais formas expostas, pois elas respiram em mim,
Desatinam a crescer e vazam das pupilas de deus;
Do epicentro lírico, algo rompe a carne da vida,
Talhando um céu de visão inflamada.
Doravante, das forças magnatas que me habitam,
Meros moldes, não suprem minhas criações
Essas vidas anseiam pela teogonia do fogo;
Pela fagulha do sopro que arde a alma;
A mera sobrevivência nunca serviu.
- Ó noite prematura, tu és a fumaça do crepúsculo prometeico; Em tua sangria, o fogo escapa dos deuses e espalha-se em um panteísmo infame, agora tudo arde em minhas mãos vis.
Tudo respira em combustões asmais, diluindo os pássaros de carvão,
Tu és o produto dos combustíveis da liberdade.
- Ó criatura, respire na fogueira que lhe concedi, arda enquanto o visgo escorre em seu crescimento.
Sou a hospedeira dessa tua composição anêmica por serotonina.
Sou a artesã das tuas extremidades derretidas.