Ninguém enxerga de verdade
07:35h da manhã.
Sinal vermelho.
Vejo, através da janela do ônibus
aquela senhora rechonchuda
sentada na calçada e
segurando pela mão direita uma criança de no máximo 2 anos.
Tentam em vão aproveitar a escassa sombra
de uma árvore.
Na placa tosca que ela segura
com a outra mão,
consigo ler algumas palavras
escrita em portunhol:
" Bom dia soy de venezuela
necesito ajuda
por favor "
Zumbis atrasados para o trabalho, para a faculdade, cegos demais, ocupados demais, cansados de existir,
passam pelos dois.
Vejo um mendigo caminhar
com passos lentos e despreocupados,
carregando uma bolsa enorme
e cheia de entulhos nas costas.
Ele pára ao lado da mulher,
que o observa desconfiada,
põe a bolsa no chão,
remexe nela por alguns segundos e então
puxa um urso de pelúcia cinzento
entregando-o ao menino,
que o recebe sorrindo
e com um olhar surpreso, tolo e imaculado
que somente as crianças possuem.
O mendigo vai embora com seus sagrados passos demorados
que só desfruta e compreende
quem detém a dádiva de não ter pressa de chegar a lugar algum
Olho ao meu redor.
Ninguém está vendo aquilo.
Estão ocupados demais com o whatsapp.
Mas sei, ele não precisa de público.
Isso fica para Youtubers, políticos e autoridades religiosas.
O sinal finalmente está verde.