Cheiro de saudade
Enquanto se beijavam com beijos
inexplicavelmente deliciosos e cheios
de palavras não ditas e sim sentidas
a pintura de um cavalo os observava.
Estava em movimento e pendurado acima da cabeceira da cama
E querendo ou não já fazia parte da cena.
E foi aquele ser estampado em tela
dividindo sua atenção em duas metades
Era como se corresse para o alvo a sua frente
e ao mesmo tempo tecesse seu olhar para baixo
freando seus galopes para analisar o que ali ocorria
Porque era bonito o que acontecia
visto que havia desejo, cumplicidade,
pele de mesma cor em atrito.
Mas era peculiar
porque mesmo antes de se ausentarem um do outro
no gosto do beijo
e em cada abraço
já havia ali cheiro diferente.
E hoje entende-se muito bem
porque o equino corria.
E foi esse o motivo: estando dessa maneira fazendo parte
de um momento assim tão secreto,
foi a única testemunha do que ocorria
e imaginou que não queria ser mais tarde interrogado
sobre o porquê de sobressaltar
no toque de um no corpo do outro
raios tão intensos feitos de uma energia diferente
E então corria
porque lhe embriagava de forma melancólica
perceber que depois daquele dia
um outro igual aquele quiça não existiria.
As cores dos dois combinaram-se
Sua mão quente passeando na cintura dela encontrava os ossos do quadril num aperto bom de ser sentido
e em todo canto,
perguntas,
desejos
delírio.
Mas era peculiar
porque mesmo antes de se ausentarem um do outro
no gosto do beijo
e em cada abraço
já havia o que realmente não há entre dois estranhos.
E foi aquele ser estampado em tela
dividindo sua atenção em duas metades:
corria para o alvo e insistia no que havia
entre aqueles dois.
E era bonito o que ali acontecia
porque ali já havia cheiro de saudade.