VISÕES NO FOGO

Acampado à noite pela coxilha

tenho visões estranhas...

Há uma lua no céu! e há uma lua na terra...

Um clarão de luar ilumina e enregela!

Passa um frio no ar... e surge um boi-tá-tá...!

e eu contemplo a sorrir, no fogo, a chama acesa...

Tenho a cuia na mão e sorvo o chimarrão...

o vento que perpassa – o Minuano por certo,

atiça a brasa acesa e uma chama se levanta

e infunde tal calor, e tanta sombra cria

que as formas tomam forma de mórbido pavor!

Ao longe no silêncio, uiva um cão pela ramada...

e eu fico a contemplar as luzes do fogão...

Eis! Se ergue uma chama altiva e forte,

lutando com as sombras em ritmo de morte!

Tem, da treva a cor negra e profunda

e em derredor de si, uma auréola dourada,

que é por certo um resplendor do sol...

Coleante e imponente peleia com as sombras!

Dominada a princípio – quase extinta na brasa...

Ergue-se outra vez!

Estica uma língua de fogo vermelho

Sacode-se no ar e investe contra a noite...

É uma luta tremenda entre a luz e a treva!

E eu cismando... olhos fitos no fogo...

Pensamentos horríveis...

Mãos negras de escravos!

dedos fortes,

nodosos,

crispados...

escorrendo suor e implorando piedade...!

Outras chamas se erguem... iluminando a noite...

E eu contemplo a tremer, rubros cascos de fogo!

Patas de baguais em cavalgadas heroicas...

Há cabeças de gado a mugir pelos campos

e há sangue escorrendo por todos os rios!

Há lições de civismo de patriarcas famosos!

e há visões tenebrosas de combates farroupilhas

de entreveros e duelos por toda a coxilha

empapada do sangue de raça feroz!

Há tinidos no espaço de armas e aperos

e sonidos de clarins vitoriosos!

– Remotas lembranças de um tempo que passou...

Eis! que as sombras mais fortes pesadas e negras,

abafam as chamas e apagam o fogo...

Em minh’alma se estampa a silhueta do pago!

– Com a lembrança de outrora e o vigor do civismo

meu olhar desperta o braseiro de novo...!

E em meu peito palpita a querência da china

enrolada no ponche, dormitando ao meu lado...

(Rio Grande-RS, 15/11/1955)

Attilio dos Santos Oliveira
Enviado por Attilio dos Santos Oliveira em 07/04/2020
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