Tempo

Eu estou sentado, ouvindo música,

Vendo o tempo passar sobre mim

Como a água que pelos meus dedos

Passa para se perder no seu destino.

Eu vivo bem, evitando obstáculos;

Evito às vezes mesmo pensar;

Pois pensar é tomar consciência

E redescobrir o mundo à volta.

E continuo meu exílio

Em mim mesmo, acreditando

Viver um paraíso eterno

Por mim mesmo construído.

Mal sei eu, pobre infeliz,

O grande engano que cometo

Fugindo do mal exterior

Para penetrar no abismo profundo

Dos meus monstros interiores,

Que são capazes de, em silencio,

Devorar, levar à loucura,

Induzir falsas idéias

De brilho duvidoso e destino incerto.

E assim vou levando

Minha existência tranqüila,

Tendo meu sorriso como garantia

Da alegria de viver em paz,

Fingindo estar alheio ao resto,

Que como algo insidioso, vil,

Sorri, afaga, atrai e destrói...