Não sinto
Eu não sinto, idealizo.
Pois não sei o que é sentir
Vivo numa bolha de sentimentos,
Irreais, morais
Mas nada é real.
É tudo minha imaginação trabalhando
Em algo para que eu possa me agarrar.
Sei que não me engano.
De tanto fingir, passei a acreditar.
Transformei em verdade, aquilo que só estava e minha mente.
Passei a vaguear.
Entre dois mundos tornei-me descrente, de tão crente que me pus a pensar.
E o sentimento equivalente, que pensava sentir, nada mais é nada mais foi do que idealização.
Mera criação. Da minha mente louca, vã.
Pois não sei o que é sentir.
Nunca experimentei tal sentimento, puro e sadio, como as águas cristalinas de um rio.
Apenas sonhei
Com sua transparência
A suavidade de suas ondas
Sua liberdade de locomoção
E sua beleza.
Tão ignóbil sou.
Prendendo-se a algo que nem sabe se existe.
Se eu idealizo, quem mais não fará isso.
E se o amor na verdade não passar de fruto da imaginação?
Idealização? Mera ilusão?
Não sei. Nunca sei.
Mas pra quê quero saber?
Eu não sinto.
Já me basta o que sofro quando idealizo.
Se sentir faz sofrer, é melhor não ter.
Pois a idealização concede o prazer de ser e ao mesmo tempo não ser.
Deixa aquela pulga atrás da orelha.
Deixa pensar que é você, quando na verdade não é ninguém.
É tudo ilusão.
Pois não sentir traz emoção, um vazio por dentro
Que transformamos em poesia, canção.
Pois é isso que o poeta faz.
Cria sentimentos, que embora não sinta desperta no leitor emoções que purificam a alma.
No lugar do desespero cria o amor, no lugar da tristeza a felicidade.
Tudo ilusão.
O poeta não sente.
Mas realiza-se através do que idealiza.