Moinho D’água

Sentado na cadeira

Diante de uma folha de papel

O poeta inicia o curioso processo

De escavar um novo rumo.

Primeiramente fica intimidado:

O ar está denso,

A cadeira pouco confortável;

E o dia lá fora lhe convida a sair

De sua obscura caverna,

Mas ele sabe a importância

De seguir em frente

no sentido do inexplorado.

Depois disso, nega sua existência como poeta:

Um poeta nunca pode ser para si mesmo um poeta

Enquanto se está sendo.

Um poeta, um romancista,

um músico, um chef de cozinha,

Nunca são o que são enquanto atuam

Estão desprendidos, muitas vezes pretensiosos,

Ansiosos com o que está por vir

Diante de sua negação,

Diante do sofrimento,

E diante de sua misteriosa busca,

É confrontado novamente:

Não há sentido no que faz!

E torna-se inimigo de si mesmo!

E cria-se um ponto de energia:

Energia que surge

Como num pequeno moinho d’água

As palavras em sua mente são a água

E seu corpo é o moinho

E a ação é gerada no violento encontro.

Agora o poeta está aprisionado

Sem saída, pois

há uma necessidade

Quase vital de escrever,

Mas ele, da mesma forma

Que negou-se a ser poeta,

Nega sua invisível

E não tão obscura prisão.

Confrontado

E entregue ao moinho e às águas

Descobre que é e não se é

ao mesmo tempo um vazio.

Negando ser o que verdadeiramente é

Consegue entregar ao papel a energia produzida

E tornar-se o que sempre foi:

Um velho moinho d’água