O AMOR
Quando era menor, eu ansiava pelo amor, era tudo o que eu mais desejava. Pensava eu que se não houvesse alguém ao meu lado eu não seria ninguém.
Quando o amor chegou ele foi sereno e intenso, foi tudo o que eu sempre desejei. Pensei comigo que o universo havia ouvido minhas preces e que o sagrado tinha tido piedade da minha pobre existência solitária.
O amor teve paciência com minhas questões mais intensas e internas. O amor dormiu de conchinha comigo, o amor me amou quando eu estava começando a me amar.
Mas passados poucos meses o amor começou a se tornar possessivo, ciumento em excesso. O amor me afastou de todos meus amigos, o amor fez com que eu achasse que todos fossem falsos comigo, o amor me afastou do que eu mais prezava... O amor me afastou de mim mesmo.
Então, o amor começou a me agredir. O amor me agredia sempre que eu fazia algo que o irritava; depois o amor usava desculpas para justificar a agregação. O amor começou me dando tapas na cara.
Mas então os tapas já não bastavam para o amor e então ele disse "eu vou começar a te bater com a mão fechada pra ver se tu aprende." E começou, o amor começou a dar socos, na barriga, nas costas, no peito, no rosto, na cabeça. Depois o amor passou a bater minha cabeça na parede.
E quando bater minha cabeça na parede já não bastava mais, o amor começou a pegar objetos para me machucar. E o amor pegava martelos, amassador de carne, panelas, pás, correntes, etc. E eu continuava a chamar o amor de amor. Sem duvidar do sentimento, sem questionar...
Mas um dia eu questionei e o amor pegou uma tesoura de jardim para tentar me cortar, e outro dia questionei novamente, o amor abriu minha cabeça com um tijolo. E eu me perguntei: "Por quê eu não fui embora no primeiro tapa? Por quê acreditei naquelas mentiras?" Em silêncio fiquei e chorei por dentro todas as lágrimas do mundo, chorei por dentro todo o oceano pacífico. E nunca perdoei o amor por isso, mas continuei a chamar o amor de amor, mesmo sem sentir mais nada por esse suposto amor.